Anamatra/USP: pesquisa analisa decisões monocráticas do STF que afastaram competência da Justiça do Trabalho

Desprestígio institucional, lesão à dignidade do trabalhador e descapitalização da seguridade social estão entre as consequências, revela estudo lançado nesta quinta (5/10)

Decisões do Supremo Tribunal Federal (STF) que afastaram a competência da Justiça do Trabalho para apreciar litígios decorrentes de relações de trabalho e fraudes oportunizam maior precarização das relações de trabalho, fomentando, em tese, o aumento de casos de condições análogas a de escravo, de trabalho degradante e até mesmo de trabalho infantil, com lesão à dignidade da pessoa trabalhadora.

Essa é uma das conclusões de pesquisa lançada, nesta quinta (5/10), pela Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra) e o Grupo de Pesquisa e Extensão “Trabalho além do Direito do Trabalho”, vinculado ao Departamento de Direito do Trabalho e Seguridade Social da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (SP). O estudo analisou decisões monocráticas do Supremo Tribunal Federal (STF) que afastaram a competência da Justiça do Trabalho para analisar a temática de reconhecimento de vínculo de emprego.

A paulatina descapitalização da seguridade social também está entre as conclusões da pesquisa. Na medida em que genuínas relações de emprego passam a ser sistematicamente descaracterizadas, sem exame das provas, e seguem subsistindo como contratos civis, contribuições sociais deixam de ser recolhidas. Isso porque, ao se considerar apenas a forma civil de contratação, o trabalhador e a empresa deixam de recolher contribuições sociais com base em remuneração e em folha de pagamento, respectivamente.

Modalidade típica da Revolução Digital (Revolução Industrial 4.0), os trabalhadores plataformizados também foram objeto de análise. Segundo os pesquisadores, há divergências sobre o tema dentro do Tribunal Superior do Trabalho (TST) e o próprio STF não firmou em plenário entendimento definitivo específico, quanto ao enquadramento jurídico, o que afasta a admissibilidade da reclamação constitucional, ação na qual se busca a preservação de um entendimento pacificado da Corte Suprema. Segundo o estudo, a competência deve ser definida pelo pedido e pela causa de pedir formulados na petição inicial, de modo que, em se tratando de lides decorrentes de relações de trabalho, a competência é da Justiça do Trabalho, mesmo que para declarar a inexistência da relação de emprego.

Sobre a pesquisa
Ao todo, a pesquisa analisou, de forma qualitativa, 303 ações relativas ao tema competência material da Justiça do Trabalho no STF. Dessas, foram selecionadas para exame de conteúdo 113 causas, 88 delas reclamações constitucionais. Apenas 15% das reclamações constitucionais analisadas, 13 no total, foram julgadas improcedentes pelo STF.

A incidência de reclamações constitucionais no STF afastando a competência a Justiça do Trabalho é crescente, explica o coordenador do Grupo de Pesquisa e ex-presidente da Anamatra, Guilherme Feliciano. “Tudo isso ocorre contrariando a jurisprudência do próprio STF, que historicamente vinha entendendo que as reclamações constitucionais não podem ser utilizadas como recursos ‘per saltum’, nem permitem revolver fatos e provas. Muitas vezes, são casos envolvendo fraudes, nas quais o STF termina por afastar a competência da Justiça do Trabalho sem considerar as questões fáticas, ou impropriamente as considerando em uma reclamação constitucional. Não raramente, outrossim, utilizam precedentes que não têm aderência ao caso concreto para afastar a aplicação do art. 114 da Constituição Federal”, alerta.

Entre as ações analisadas pela pesquisa estão processos relativos a trabalhadores plataformizados, motoristas autônomos de cargas (MEI/ caminhoneiros), parceiros em salões de beleza, corretores de imóveis, médicos, representantes comerciais e advogados associados. O estudo também debate os fenômenos da ‘pejotização’ e da terceirização.

Para a presidente da Anamatra, juíza do Trabalho Luciana Conforti, os dados relevados pelo estudo corroboram a realidade de se defender e preservar a competência constitucional da Justiça do Trabalho pelo STF. Segundo Conforti, o cenário impõe maior aproximação e diálogo institucional, a fim de que eventuais divergências interpretativas possam ser superadas e haja maior entendimento no cenário das transformações trazidas no mundo do trabalho com as tecnologias, além das novas configurações do trabalho. “O desafio é definir o melhor enquadramento jurídico, para que as essas trabalhadoras e trabalhadores não fiquem à margem de qualquer proteção. Os direitos sociais, afinal, estão previstos como cláusula pétrea na Constituição”, ressalta.

Clique aqui e confira a íntegra da pesquisa

 

Seminário e participações

O lançamento do estudo aconteceu Seminário “Jurisdição Constitucional e Competência Material da Justiça do Trabalho: 35 anos da Constituição de 88”, realizado pela Anamatra na Escola Judicial do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região, com transmissão ao vivo pelo canal da TV Anamatra no Youtube. O evento contou com o apoio institucional da Ejud 2, do TRT 2, da Associação dos Magistrados do Trabalho da 2ª Região (Amatra 2/SP), da Associação Nacional das Procuradoras e Procuradores do Trabalho (ANPT) e da Associação Brasileira de Advogados Trabalhistas (Abrat).

Conduzido pela presidente da Anamatra, Luciana Conforti, e pelo juiz do trabalho Guilherme Feliciano, o seminário trouxe exposições dos pesquisadores e falas dos convidados: o  professor da PUC-PR José Affonso Dallegrave Neto, a procuradora Nacional de Trabalho e Emprego da Advocacia-Geral da União (AGU), Mônica de Oliveira Casartelli, e o advogado Mauro Menezes. 

Também integraram as exposições a presidente do TRT 2, desembargadora Beatriz de Lima Pereira, o presidente do TRT 15 (Campinas e Região), desembargador Samuel Hugo Lima, a desembargadora aposentada Silvana Abramo Ariano, vice-coordenadora da pesquisa, o subprocurador-geral do Trabalho André Royer Spies, a procuradora Vera Lúcia Carlos, da Procuradoria Regional do Trabalho da 2ª Região, o presidente da ANPT, José Antonio Vieira de Freitas Filho, o presidente da Associação dos Advogados Trabalhistas de SP (AATSP), Afonso Paciléo, o diretor do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho (Sinait)m Renato Bignami, e os representantes da Abrat e da Força Sindical, respectivamente,  Otávio Pinto e Silva e César Augusto de Mello. 

Pela Anamatra, também participaram do evento o vice-presidente, Valter Pugliesi, a diretora de Cidadania e Direitos Humanos, Patrícia Sant'Anna, o diretor de Formação e Cultura, André Dorster, o juiz Felipe Calvet, diretor de Informática, e o juiz Márcio Amaral, integrante do Conselho Fiscal. O presidente da Amatra 2 (SP), Bruno Perusso também participou do evento.

Clique aqui e confira as fotos do seminário

Confira a íntegra do evento e as exposições dos participantes:

 

Justiça do Trabalho existe, resiste, persiste

A iniciativa da pesquisa integra a campanha da Anamatra “Justiça do Trabalho existe, resiste, persiste”, lançada formalmente durante o Seminário. O objetivo é falar da importância da preservação da competência da Justiça do Trabalho, ampliada pela Constituição Federal a partir da Emenda Constitucional 45/2014.

Clique aqui e saiba mais sobre a campanha.

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Informações à imprensa:

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Weslei Almeida
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