Por Adriana Aguiar, de São Paulo
Os juízes trabalhistas resolveram tomar a frente para resolver o problema causado pela indefinição sobre a forma de cálculo do adicional de insalubridade devido pelas empresas aos seus funcionários. Eles encaminham hoje ao presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva um pedido de edição de uma medida provisória (MP) para definir o tema. A Associação dos Magistrados do Trabalho (Anamatra), autora do pedido, sugere que a base de cálculo do adicional seja o salário básico do trabalhador - o que aumentaria consideravelmente os valores a serem pagos pelas empresas.
Até 9 de maio deste ano, a base para o cálculo do adicional de insalubridade era o salário mínimo. Mas neste dia foi publicada no Diário Oficial da União a Súmula Vinculante nº 4, editada pelo Supremo Tribunal Federal (STF), que veda qualquer indexação ao salário mínimo. A decisão do Supremo acabou por criar um vácuo legal, já que o texto da súmula também determina que a base de cálculo a ser utilizada deve ser estabelecida por uma nova lei, e não por meio de uma decisão judicial. Por conta disso, o Supremo derrubou, por liminar, uma súmula posterior do Tribunal Superior do Trabalho (TST) que fixava a base de cálculo no salário básico - ou seja, o total do salário do trabalhador menos os adicionais como gratificações, prêmios e participações nos lucros - diante do impedimento do habitual uso do salário mínimo. A liminar foi pedida pela Confederação Nacional da Indústria (CNI), que argumentou que a súmula do TST contraria a súmula vinculante do Supremo, já que esta impede que a forma de cálculo seja definida por decisão judicial.
Segundo o presidente da Anamatra, Cláudio José Montesso, a única solução imediata para preencher o vácuo na legislação seria a edição de uma medida provisória, que, segundo ele, "já conta com simpatia do governo". O salário básico como base de cálculo seria a melhor saída, de acordo com o presidente da entidade, pois assim "uniformizaria a base de cálculo que vale para os demais adicionais existentes", diz.
A associação deve encaminhar, além de uma minuta para justificar a medida e a urgência da edição, uma sugestão de texto para a medida provisória. A idéia é alterar o artigo 192 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), que ficaria da seguinte forma: "O trabalho em condições insalubres assegura ao trabalhador a percepção do adicional de insalubridade correspondente a 40%, 20% ou 10% incidentes sobre o seu salário básico, segundo a insalubridade se classifique, respectivamente, nos graus máximo, médio ou mínimo, sem os acréscimos resultantes de gratificações, prêmios ou participações de lucros das empresas".
Segundo o desembargador Sérgio Pinto Martins, do Tribunal Regional do Trabalho (TRT) da 2ª Região, com sede em São Paulo, a indefinição da situação, além de causar insegurança jurídica para as empresas que não sabem como pagar o adicional, também deixa os juízes sem uma orientação a respeito do assunto. "Já conversei com minha turma de julgamento a respeito e pensamos em aplicar o salário mínimo até que haja uma nova regra, mas ainda não temos uma posição definida", diz. Outra possibilidade que ele cogita é a de adotar o critério anterior ao mínimo, que seria o do piso nacional estipulado em 40 BTNs (Bônus do Tesouro Nacional). Um BTN hoje vale R$ 1,51. A idéia dele seria aplicar as alíquotas de 10%, 20% ou 40% sobre estes 40 BTNs (R$ 60). "Sempre achei que era inconstitucional aplicar o mínimo e já apliquei esse cálculo em alguns casos que julguei", afirma.
Já o desembargador Sebastião Geraldo de Oliveira, do TRT da 3ª Região, com sede em Minas Gerais, acredita que deverá aplicar o salário básico em suas decisões, seguindo o princípio da analogia. "Todos os outros adicionais como o de periculosidade, o adicional noturno, a hora extra, tem como base o salário básico do trabalhador. Não teria porque ser diferente para o de insalubridade", diz. Segundo o juiz, os casos que entraram na Justiça antes da Súmula Vinculante nº 4 devem ser decididos com a base no mínimo. "O novo critério só estaria valendo a partir da edição da vinculante", afirma.
Apesar de os desembargadores estudarem a adoção de critérios diferentes, ambos concordam que só haverá segurança jurídica sobre o tema com a edição de uma nova norma. "Só assim vamos conseguir superar esta dificuldade interpretativa", diz Oliveira.
O advogado trabalhista André de Melo Ribeiro, do escritório Felsberg Associados, tem recomendado às empresas que assessora que continue calculando o adicional com base no mínimo. "Na ausência de uma norma, acredito que deva continuar valendo a lei antiga, já que a própria vinculante prevê que deve ser editada uma nova regulamentação", acredita. O temor, porém, é que depois de editado um novo critério, haja a cobrança dos valores pagos a menos. O advogado trabalhista Guilherme Gantus, do escritório Gantus Advogados, segue a mesma linha. "Não há regra hoje que obrigue o empregador a pagar o adicional com base no salário básico", afirma. "Enquanto a súmula do TST estiver suspensa ou não houver uma nova lei, as empresas devem se basear no mínimo."
No julgamento do recurso que suspendeu a validade da súmula do TST que previa o salário básico para o adicional, o presidente do Supremo, ministro Gilmar Mendes, reconheceu que a decisão repercutiria em 580 processos na corte e algo em torno de 2,4 mil no TST. De acordo com seus assessores, a posição do ministro é a de que o salário mínimo deve ficar como indexador até que a lei crie outro, em obediência à Constituição - e os tribunais não podem simplesmente substituí-lo.