Sindicatos de diversas categorias firmaram pelo menos 107 acordos coletivos com base nas medidas provisórias trabalhistas publicadas pelo governo federal para combater os efeitos da pandemia da covid-19 na economia.
Os dados são do Sistema de Negociação Coletivas da Secretaria de Trabalho do Ministério da Economia e são referentes até o dia 23/4. Do total de negociações, 92 foram feitas com base na MP 936, publicada em 1º de abril, que permite a redução salarial de trabalhadores.
Para especialistas em Direito do Trabalho, o número "pequeno" de participação dos sindicatos mostra um impulso a favor das negociações individuais, principalmente após o Supremo Tribunal Federal (STF) não ratificar a liminar que obrigava a comunicação aos sindicatos.
A MP 936/2020 institui o Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda e permite a redução proporcional de jornada de trabalho e salário. A redução de jornada poderá ser de 25%, 50% ou 75%.
O texto da medida também permite que trabalhadores com o salário de até R$ 3,1 mil ou superior a R$ 12,2 mil possam negociar com o empregado de forma individual. Já os empregados com salário entre esses dois valores precisam, obrigatoriamente, do acordo com a participação dos sindicatos.
Os dados da Secretaria de Trabalho também indicam que foram firmados pelo menos 15 acordos com base na MP 927/2020, publicada no dia 22 de março, e que regulamenta o teletrabalho, concessão de férias coletivas e antecipação de feriados.
Além disso, se também for levado em conta outros tipos de acordos coletivos, como para que o empregado forneça produtos essenciais de proteção ao trabalhador, como álcool gel e máscaras, as negociações sobem para quase 350.
Um dos acordos firmados foi de um sindicato do ramo das empresas alimentícias em Pernambuco. O acordo deixa claro que em virtude da edição da MP 936/20 e com o intuito de "preservar os empregos dos trabalhadores, faculta-se aos empregadores a promoção da redução proporcional e temporária da jornada de trabalho e dos salários ou a suspensão temporária do contrato de trabalho dos seus empregados".
O acordo assevera que Governo Federal pagará parte do seguro desemprego dos trabalhadores como forma de complemento ao corte salarial.
Um sindicato que representa a classe de motoristas urbanos e rodoviários em São José do Rio Preto e outras cidades do interior de São Paulo firmou acordo coletivo para que os funcionários da categoria tenham a redução salarial de 25%. "Cessados os efeitos decorrentes da pandemia do Coronavírus (Covid-19), é garantido o restabelecimento dos salários reduzidos", estabelece o acordo.
No ABC Paulista, região metropolitana de São Paulo, o Sindicato dos Metalúrgicos negociou com a Toyota uma proposta de layoff dos trabalhadores. Além disso, o acordo prevê que trabalhadores com a remuneração mensal de até R$ 3,1 mil não terão redução salarial. Para quem ganha até R$ 7 mil, a redução será de 5%. Para quem recebe entre R$ 7 mil e R$ 9 mil, o desconto será de 10%. Nas demais faixas salariais o desconto é progressivo, podendo chegar a 25%.
A Tigre Materiais e Soluções para Construção firmou acordo para que ocupantes de cargos operacionais e administrativos até o nível de coordenador tenham redução salarial de 25%. Gerentes terão redução de 30% e diretores 40%.
O acordo foi feito com base no "fato público e notório que o Brasil enfrenta uma emergência de saúde pública e estado de calamidade decorrentes da pandemia do covid-19".
Para o juiz trabalhista e ex-presidente da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho, Guilherme Feliciano, os números de acordos coletivos ainda são pequenos. "Temos no Brasil cerca de 17 mil sindicatos. Neste contexto, podemos supor que existam muitas negociações individuais sem os sindicatos", afirma.
Feliciano acrescenta que as negociações individuais foram impulsionadas pela não ratificação da liminar do ministro Ricardo Lewandowski, do STF, que tinha estabelecido a necessidade de comunicação aos sindicatos sobre a redução de jornada de trabalho, de salário ou suspensão de contrato.
Feliciano acrescenta que os acordos coletivos geram uma maior segurança aos trabalhadores e empregados e evitam judicializações por má-fé. "O empresário terá a garantia que o acordo foi feito com o sindicato e, portanto, o trabalhador não poderá alegar que assinou o acordo individual com qualquer tipo de vício de consentimento", diz.
Para José Eymard Loguercio, sócio do escritório LBS Advogados, a participação dos sindicatos permite um tratamento uniforme das empresas, principalmente as de grande porte, com os funcionários.
"Se temos um trabalhador que recebe R$ 3 mil e outro R$ 3,5 mil um precisa negociar individualmente e outro com o sindicato. Isso não faz sentido. Uma regra para todos é preferível", conclui o advogado trabalhista.