FUNDAMENTAÇÃO:
A concepção lingüística sexista, que oculta o feminino por trás do masculino e não contempla as diversas identidades de gênero, está culturalmente implicada numa visão desigual e discriminatória acerca das atribuições e capacidades da mulher e de todas as demais identidades de gênero frente ao homem, promovendo a dicotomia dominação/sujeição entre o feminino e o masculino nas relações da vida em Sociedade.
Superar essa problemática inserta na sutileza das palavras exige esforço e engajamento contínuo na dissociação do padrão masculino como gênero prevalente a abarcar o todo humano.
Cabe salientar que a Resolução CNJ nº 376, de 2 de março de 2021, dispõe sobre o emprego obrigatório da flexão de gênero para nomear profissão ou demais designações na comunicação social e institucional do Poder Judiciário nacional, de modo que fundamenta a tese que ora se propõe.
Nisso, justifica-se a alteração na nomenclatura das entidades associativas, bem como de seus congressos, com o abandono do uso do masculino no plural heterogêneo, utilizando-se a linguagem de gênero e/ou os coletivos para designar um conjunto de pessoas integrados pelas diversas identidades de gênero, ou, ao menos, repetindo-se as palavras no masculino e no feminino para abranger todas as pessoas.
Assim, a alteração na nomenclatura das Associações e de seus congressos representativos é uma necessidade premente para promover a inclusão e a representatividade de todas as pessoas.

REFERÊNCIAS:
Sobre a linguagem inclusiva de gênero, veja-se a Tabela de Recomendações para a Utilização de uma Linguagem Inclusiva, e também a seguinte coletânea de textos:
CANNABRAVA, Beatriz. Uma linguagem inclusiva. PANDJIARJIAN, Valéria. O mundo no masculino e no feminino: plural dos gêneros. VIEZZER, Moema. A=O Campanha por uma educação não discriminatória na América Latina. Todos disponíveis em: http://www.scribd.com/doc/7276276/Linguagem-inclusiva. Acesso em: 30 dez. 2009.
COVAS, Fabíola Sucasas Negrão. BERGAMINI, Lucas Martins. Análise crítica da linguagem neutra como instrumento de reconhecimento de direitos das pessoas LGBTQIA+. Disponível em: https://ojs.brazilianjournals.com.br/ojs/index.php/BRJD/article/view/30768 Acesso em: 18 mar. 2024.
VIEIRA, Vera. A discriminação à mulher está presa à tirania das palavras e imagens. Disponível em: https://mulherespaz.org.br/site/wp-content/uploads/wpcfto_files/d0ded7c6c31136477169eda280895ebeLinguagem-Inclusiva-de-Imagens-e-Palavras.pdf Acesso em: 18 mar. 2024.
Sobre a dicotomia dominação/sujeição, ver: CORNWALL, Andrea. JOLLY, Susie. (Org.). Questões de sexualidade: ensaios transculturais. Tradução de Jones de Freitas. Rio de Janeiro: ABIA, 2008. Título original: IDS Bulletin: sexuality matters.
O uso da linguagem inclusiva de gênero na legislação e documentos oficiais foi objeto do PL 4.610/2001, que tramitou na Câmara dos Deputados e foi aprovado nas Comissões da Câmara e do Senado. Sobre o mesmo tema, foi apresentado o PLC 438/2008, com requerimento do Relator da CCJC – Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania pela declaração de prejudicialidade, ante a identidade de matéria com o PL 4.610/2001. O PL 4.610/2001 foi arquivado em 2023 porque a proposição ficou por cinco legislaturas completas sem aprovação (Resolução da Câmara dos Deputados n. 33/2022, art. 3º). Também foi apresentado o PL 568/2023, apensado ao PL 4690/2012, por sua vez apensado ao PL 756/2011, que dispõe sobre normas de equidade de gênero e raça, de igualdade das condições de trabalho, de oportunidade e de remuneração no serviço público, atualmente aguardando parecer do relator na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJC). Disponível em: https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao/?idProposicao=495113 18 mar. 2024.
CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, Resolução CNJ nº 376, de 2 de março de 2021.

Para que os Tribunais de Segundo grau efetivamente tenham equidade no número de julgadores mulheres e homens, há efetiva necessidade de alteração na legislação para contemplar também a indicação do quinto Constitucional.

Tão quanto seja possível dentro da organização e administração da unidade judiciária, os autos que versem acerca de fatos relativos a violência sexual ou moral em face de mulheres devem ser instruídos e julgados por magistradas do sexo feminino. Também, durante a instrução processual, a assistência ao magistrados na sala de audiência deve ser feita por servidora do sexo feminino.

De acordo com o Protocolo de Julgamento sob a perspectiva de Gênero do CNJ, a declaração da vítima possui importante valor probatório, mormente quando, ante o contexto das provas, é possível concluir pela existência de constrangimento de cunho sexual sofrido pela trabalhadora. No entanto, de acordo com o art. 848 da CLT, em sendo o interrogatório dos litigantes faculdade do Juiz, este poderá dispensar o depoimento da reclamante/vítima quando constatar o constrangimento em rememorar tais fatos em uma audiência, que esta possa estar sofrendo constrangimento moral ou coação para não detalhar os fatos em juízo. Observadas tais circunstâncias, a dispensa da sua oitiva não resultara em nulidade processual.

Fernanda Formighieri e Viviane Leite

O assédio e a violência no mundo do trabalho, além de incompatíveis com o trabalho digno e decente, afeta a saúde física e mental das pessoas trabalhadoras, trazendo impactos psicológicos, pessoais, sociais e profissionais. Há no Direito do Trabalho omissão legislativa em relação à definição do assédio sexual, cabendo à doutrina e jurisprudência juslaboral desenvolverem a temática. No mesmo sentido, não se observa na legislação trabalhista a previsão de regras específicas para condução processual sensível ao gênero.

Uma pesquisa da Organização Think Eva (2020) apontou que 47,12% das mulheres afirmavam ter sofrido assédio sexual no trabalho, através de práticas como solicitação de favores sexuais (92%), contato físico não solicitado (91%) ou abuso sexual (60%). Vale destacar que, pautadas em opressões de gênero, as práticas que configuram assédio sexual, correspondem à violência de gênero, diante da sua desproporcional incidência em relação ao gênero.

A Convenção 190 da OIT conceitua violência e assédio como um conjunto de comportamentos e práticas inaceitáveis, ou a ameaça deles, realizados com frequência ou numa única vez, de modo que “visem, causem, ou sejam susceptíveis de causar dano físico, psicológico, sexual ou econômico”, destinado a todas as pessoas inseridas no mundo do trabalho, incluindo estagiários (as) ou aprendizes, pessoas despedidas ou em busca de emprego, e as pessoas que exercem em geral os deveres ou a autoridade de empregador, nos setores público ou privado. O item “b” do artigo 1° especifica a violência de gênero, demonstrando que a OIT está atenta à realidade das mulheres no mercado de trabalho, as quais estão mais suscetíveis e vulneráveis às práticas de violência. A Recomendação n.º 206, que complementa a Convenção n.º 190, estabelece a abordagem “inclusiva, integrada e sensível ao gênero” a ser assegurada pelos membros na abordagem da violência e assédio no mundo do trabalho.

A Recomendação Geral n. º 33 CEDAW dispõe que “a discriminação contra as mulheres, baseada em estereótipos de gênero, estigmas, normas culturais nocivas e patriarcais, e a violência baseada no gênero, que particularmente afeta as mulheres, têm um impacto adverso sobre a capacidade das mulheres para obter acesso à justiça em base de igualdade com os homens”.

g, à luz do qual as demandas que envolvam assédio e violência contra mulheres no ambiente de trabalho devem ser analisadas.

O Protocolo do CNJ aponta expressamente para a necessidade de qualificar o depoimento da vítima como meio de prova, de inquestionável importância quando se discute violência de gênero, diante da sua realçada hipossuficiência processual. Portanto, proceder à oitiva da pessoa indicada nos autos como sendo aquela que cometeu o assédio sexual, na condição de testemunha, conferindo-lhe um valor probatório superior ao depoimento da vítima, perpetua e chancela o sistema de violências estruturais ao qual as mulheres se encontram submetidas no mundo do trabalho.

Visando concretizar a garantia de amplo acesso ao Poder Judiciário trabalhista às mulheres vítimas de violência no mundo do trabalho, conferindo o adequado valor probatório à palavra da vítima, não se afigura possível a oitiva, na condição de testemunha, da pessoa apontada como agressora, nos processos que versem sobre assédio sexual.

A valorização jurídica do trabalho no Brasil ainda está em construção, seja a nível individual, seja a nível coletivo. Não há incentivo a relações de trabalho duradouras, porque ausente a proteção no emprego.¹ Os vínculos são desfeitos de forma unilateral, sem percalços ou dificuldades, salvo as hipóteses legais de estabilidade provisória ou garantia de emprego, o que impõe ao trabalhador uma posição de fragilidade, agravada pela demasiada oferta de mão de obra e pelas crises econômicas cada vez mais frequentes e duradouras, que respaldam o despedimento em massa, com impactos severos não apenas na esfera individual do trabalhador, mas em toda a sociedade em volta, que recebe toda mão de obra dispensada , aumentando ainda mais a quantidade de mão de obra excedente , com maiores dificuldades de reinserção no mercado de trabalho.

O Supremo Tribunal Federal, ao decidir o Tema 638, declarou ser imprescindível a intervenção sindical prévia anteriormente às demissões em massa, ocorridas após 14.06.2022. Tal decisão oportuniza a negociação por melhores condições de rescisão contratual para os trabalhadores, o que representa um soluço de participação dos Sindicatos como meio de reduzir os impactos deletérios da despedida em massa na sociedade e especialmente para o trabalhador.

O fato é que, mesmo que seja desejável e justificável a imposição da negociação prévia ao despedimento coletivo, questiona-se em que medida tal obrigatoriedade imposta pela Jurisprudência, sem delineamento legal do seu procedimento, efetivamente é suficientemente capaz de tutelar o trabalhador, individualmente despedido, num contexto de despedimento em massa, mormente nas hipóteses em que a despedida discriminatória pode estar escamoteada sob o véu da despedida coletiva.

Para além disso, embora o Brasil adote um regime jurídico de despedimento livre, sem a necessidade de motivar o ato da despedida pelo empregador, nada impede que sejam estabelecidos critérios de proteção do trabalhador nas despedidas consideradas ilícitas, como é o caso das despedidas discriminatórias, que desrespeitam os princípios fundamentais do trabalhador².

Por essa razão, é necessário o olhar atento do Judiciário Trabalhista para garantir a tutela dos trabalhador, com respaldo nos direitos humanos, para além da exigência formal da negociação sindical prévia à despedida, para também investigar a ocorrência de despedidas discriminatórias, investigando-se os critérios da seleção social dos trabalhadores , nos casos em que a empresa manter a sua atividade econômica, utilizando-se da importante ferramenta do Protocolo de Julgamento com Perspectiva de gênero, aliado aos dispositivos da Lei nº 9.029/99 e Súmula 443 do TST.³

Uma vez que a legislação pátria prevê pagamento de indenização, além de possibilidade de reintegração e pagamento de indenização por danos morais, há instrumentos preciosos para a efetiva proteção do trabalhador com marcações de vulnerabilidades. Uma vez considerado lícito o despedimento coletivo, mediante negociação prévia do sindicato, ataca-se as despedidas ilícitas de cunho discriminatório.

A quando do caso concreto, o juiz/juíza pode questionar-se , com base no passo a passo do Protocolo: “há um tratamento manifestamente desigual na fixação dos critérios estabelecidos para a seleção dos trabalhadores? Se sim, a justificativa para tal é fruto ou perpetuadora de desigualdades? determinada norma ( no caso critério de despedimento adotado pela empresa) tem um impacto desproporcional sobre determinado grupo? Se sim, esse impacto é fruto ou perpetuador de desigualdades estruturais?

A partir desses questionamentos, com respaldo no próprio art.765 da CLT, deve o magistrado/magistrada investigar a ocorrência de discriminação, para no decorrer da instrução processual obter informações sobre os critérios adotados pela empresa para a demissão dos trabalhadores.

Por todo o exposto, defende-se que a magistratura trabalhista deve atuar nos despedimentos coletivos, com respaldo na legislação antidiscriminatória e à luz do protocolo de julgamento com perspectiva de gênero, a fim de garantir efetiva tutela dos trabalhadores e trabalhadoras nas despedidas individuais de cunho discriminatório sob o véu da despedida em massa, aparentemente lícita pela existência de negociação prévia.

Referências:

(1A situação é tão tormentosa que originou o ajuizamento de mais de cinco milhões de ações para discutir rescisão contratual e pagamento das verbas decorrentes disso, conforme Justiça em números 2016 do Conselho Nacional de Justiça-CNJ (CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. Justiça em números 2016. Disponível em: http://www.cnj.jus.br/files/conteudo/arquivo/2016/10b8f46be 3dbbff344931a933579915488.pdf. Acesso em 25 abr. 2018). Tal cenário manteve-se, conforme dados consultados na Justiça em números de 2023- CNJ, conforme https://www.cnj.jus.br/wp-content/uploads/2023/08/justica-em-numeros-2023.pdf

(2 A Convenção nº 111 da OIT está inserida no ordenamento jurídico nacional em 1968, por meio do decreto nº 62.150, de 19 de janeiro. Ademais, há proibição de discriminação em matéria de emprego e profissão, inclusive com respaldo na Declaração Universal dos Direitos do Homem, conforme consta do seu preâmbulo. O art. 1º veda a preferência ou exclusão fundada na raça, cor, sexo, religião, opinião política, ascendência nacional ou origem social, que tenha por efeito destruir ou alterar a igualdade de oportunidade ou de tratamento em matéria de emprego ou profissão.

(3 Enunciado 443 do TST: “DESPEDIDA DISCRIMINATÓRIA. PRESUNÇÃO. EMPREGADO PORTADOR DE DOENÇA GRAVE. ESTIGMA OU PRECONCEITO. DIREITO À REINTEGRAÇÃO. Presume-se discriminatória a despedida de empregado portador do vírus HIV ou de doença grave que suscite estigma ou preconceito. Invalidado o ato, o empregado tem direito à reintegração no emprego.”

A discriminação indireta é uma derivação de norma ou prática institucional que enseje impacto desproporcional e negativo para um grupo específico, estando presente na ocorrência de ato normativo ou de gestão que, embora explicitamente não determine exclusão, implique efeito diferenciador em prejuízo de magistradas(os) em situação de adaptação quantitativa de trabalho por motivo de saúde, por ser pessoa com deficiência ou em decorrência da parentalidade atípica.

 Compreende-se haver lacuna em LOMAN, sendo sabido que, a respeito de limitações para o trabalho por motivo de saúde, disciplina sucintamente a Lei n. 8.112/90 que a readaptação ocorre com ocupação em cargo de atribuições e responsabilidades compatíveis com a limitação que tenha sofrido o/a servidor/a em sua capacidade, verificada em inspeção médica (art. 24), sendo expressa que na readaptação será respeitada, entre outros, a equivalência de vencimentos.

 Além disso, a Resolução n.º 343 do CNJ estipula a concessão de condições especiais de trabalho a magistradas(os) com deficiência, necessidades especiais ou doença grave, ou que tenham filhos(as) ou dependentes legais nessa condição, dentre elas a concessão de jornada especial e o exercício da atividade em regime de teletrabalho, sem acréscimo de produtividade, podendo implicar, para a magistratura em redução dos dias de audiência, do número de processos em pauta e conclusos para julgamento, decisão ou despacho.

 A CF/88 estabelece o dever de prevenção no art. 7^o, XXII e XXVIII, derivando do texto constitucional o direito das pessoas trabalhadoras, independentemente do regime jurídico a que estejam submetidas, à redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança; assim como o direito ao meio ambiente de trabalho seguro e saudável (art. 225).

 Além da Convenção n. 155 da OIT, a 110.ª Conferência Internacional do Trabalho da OIT incluiu segurança e saúde aos Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho, e que de acordo com os princípios da ONU, da OMS e da OIT, todas as pessoas cidadãs do mundo têm o direito a um trabalho seguro e saudável e a um ambiente de trabalho que lhes permita ter uma vida produtiva do ponto de vista social e econômico. Integrando o núcleo de direitos trabalhistas fundamentais, o direito a um ambiente de trabalho seguro e saudável, tenham ou não ratificado as Convenções relevantes, constituem compromisso do Estado Brasileiro a ser respeitado e promovido em âmbito da iniciativa privada e nas atividades prestadas nos serviços públicos, em sentido amplo, incluindo agentes políticos e categoria de magistradas(os) trabalhistas.

 Deve ser observado, que a Convenção Internacional sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência, aprovada pelo Congresso Nacional, mediante procedimento previsto no artigo 5º, §3º da CF/88, o que lhe conferiu status de emenda constitucional e, posteriormente, inserida no ordenamento pelo Decreto nº 6.949/2009, estabelece como princípios a não-discriminação e a igualdade de oportunidades, inclusive no trabalho, dentre outros. A norma determina ainda a adoção de medidas necessárias para assegurar às crianças o pleno exercício de todos os direitos humanos, em igualdade de condições com as demais crianças (art. 7ª), assim como reconhece o direito das pessoas com deficiência a um padrão adequado de vida para si e para sua família (Art. 28).

 Além disso, vale registro no sentido de que situações de exigência de alta produtividade, sob condições inadequadas, a exemplo de estruturas precárias, prazos limitados, tensão emocional ou excesso de horas de trabalho, podem contribuir para esgotamento físico e psíquico do indivíduo. Nesse contexto, atividades que demandam grande esforço de concentração, alto desempenho intelectual e controle emocional também se inserem naquelas de riscos psicossociais, caso da magistratura.

 Apontam estudos da FIOCRUZ¹ que riscos psicossociais e o estresse relacionados ao trabalho estão associados a comportamentos prejudiciais, incluindo consumo excessivo de álcool, aumento do tabagismo, hábitos alimentares inadequados, exercícios físicos menos frequentes e padrões de sono irregulares, reiterando que é considerado risco ergonômico qualquer fator que possa interferir nas características psicofisiológicas da pessoa trabalhadora, causando desconforto ou afetando sua saúde.

 Some-se aos fundamentos da tese proposta que em estudo realizado com magistradas(os) trabalhistas para investigação de estresse ocupacional, resultados encontrados entre participantes apontaram que as fontes de tensão excessivas no trabalho estão relacionadas ao elevado número de audiências realizadas e sentenças proferidas, identificando-se também situações como o isolamento, o peso emocional do julgamento, além do ônus da responsabilidade sobre a liderança em relação às atividades administrativas e de gestão, acrescidos da competitividade entre os pares, determinando sintomas de estresse relacionados a insônia, irritabilidade excessiva, cefaleia, depressão, diminuição da libido e disfunções sexuais.²

 Reflete Byung Chul Han³ que sendo vivenciado o tempo da “afirmação” em sociedade contemporânea, há profunda interação da psiquê em conformação de um “sujeito do desempenho”, dirigido à maximação de sua performance, à gratificação pelo atingimento de metas que subjetivamente jamais se exaurem, mas são substituídas sucessivamente e em continuada coação por resultados, fomentando em aspecto individual perturbações narcísicas como a persistente sensação de culpa ou insuficiência; em dimensão coletiva o estado concorrencial, dissolvendo laços comunitários de apoio, cooperação, solidariedade.

 De outro lado, é importante assentar que a condição de magistrada(o) trabalhista não põe em suspensão as desigualdades estruturais da vida em sociedade, com ampliada escassez de tempo às mulheres magistradas, pela prevalência feminina em destinação de tempo a atividades domésticas e de cuidado, as quais são aumentadas em se tratando das que são mães ou cuidadoras de pessoas com deficiência, necessidades especiais ou doenças graves.

 Nesse contexto, explica Bárbara Ferrito, que embora o tempo seja criação social a todos distribuída, os usos dos tempos sofrem consequências das determinações sociais e dos papéis diferentes entre seus atores. Assim, o consumo do tempo é distinto entre homens e mulheres, sendo que para estas ocorre atravessamento de desigualdades de gênero que socialmente as impele ao gasto de mais tempo que homens em dedicação a tarefas de cuidado, revelando o uso do tempo uma feição desigual das relações de poder em sociedade. Enquanto para os homens “tempo é dinheiro”, não possuem as mulheres igual disponibilidade sobre o tempo, apresentando a autora, por dados e pesquisas, que as mulheres enfrentam mais desafios e gastam mais tempo organizando, gerindo e executando tarefas vinculadas a cuidado.⁴

 Logo, a invisibilização dessas dimensões implica efeitos concretos gravosos e desproporcionais, em especial quanto à saúde, quando elaborados atos normativos, decisões, etc., que não considerem as distintas realidades que atravessam de modo diverso homens e mulheres, pessoas com saúde hígida versus pessoas demandantes de readaptação profissional.

 Pois bem, se há pessoas que, atravessadas por adoecimento físico ou psíquico, por serem pessoas com deficiência ou por exercerem o cuidado de pessoas com deficiência, estão posicionadas em desequilíbrio com relação à disponibilidade de tempo e de condições fisiopsíquicas para dedicação ao trabalho, em sua dimensão quantitativa; e mesmo se indicada a redução quantitativa de trabalho por profissionais de saúde, é certo que são impactadas diferentemente por normas que não levem em consideração as disparidades materiais subjacentes, quando atos normativos ou de gestão não são formulados nem aplicados em perspectiva de diversidade, impondo a magistradas(os) que se situem em tais posições estresse acentuado e risco de sofrer processos administrativos disciplinares por baixa produtividade, ou sejam excluídas/os de recebimento de vantagens remuneratórias/indenizatórias associadas ao atingimento de metas que priorizem aspecto quantitativo, violando o princípio constitucional de isonomia e equivalência de vencimentos que também se aplica a magistradas(os) trabalhistas.

 Conclui-se que a adaptação por motivo de saúde e a concessão de condições especiais de trabalho, da magistrada(o) em atividade com reflexos em dimensão quantitativa compatível com limitações ou restrições, não pode acarretar redução do patamar de vencimentos, o que desvirtuaria o propósito de prevenção ao adoecimento profissional, terminando por tornar ineficaz a redistribuição de trabalho como alternativa para quem atravesse situação de redução da sua capacidade ou possibilidade laborativa, em violação, consequentemente, da dignidade da pessoa humana.

 Atos, decisões e normas administrativas elaboradas e interpretadas sob padrões artificialmente neutros e abstratos podem impactar diferentemente magistradas(os), incorrendo em discriminações. Para o fim de concretização da impessoalidade como vetor axiológico de orientação de atos administrativos, é necessário observar a igualdade de tratamento em direção substancial, destinada à efetivação desse princípio com atenção às diversidades entre pessoas. Tal não ocorrendo, é discriminatória a atividade da Administração Pública, porque violadora da dignidade de magistradas e magistrados em situação de adaptação quantitativa de trabalho por motivo de saúde, pessoas com deficiência e pais e mães de pessoas com deficiência, resultando sejam impactadas desproporcionalmente por medidas que acabam por restringir ou impossibilitar a fruição de vantagens e benefícios em igualdade de oportunidades em relação a seus pares.

 Diante disso, deverá a ANAMATRA, propor ações para que a perspectiva em diversidade seja observada para a materialização do princípio da igualdade no âmbito da Justiça do Trabalho, da elaboração à execução de atos normativos e administrativos que impliquem efeito diferenciador e excludente em prejuízo de magistradas(os) com adaptação quantitativa de trabalho por motivo de saúde ou por concessão de condição especial de trabalho nos termos da Resolução n. 343 do CNJ, violando o direito os princípios da isonomia, de equivalência de vencimentos e o princípio fundamental ao trabalho seguro e saudável e a um ambiente de trabalho que permita à magistrada(o) uma vida produtiva em perspectiva social e econômica.

1 Disponível https://encurtador.com.br/uV139.

2MAGALHÃES, Samildes Silva; NASCIMENTO-SANTOS, Jair; ZILLE, Luciano Pereira. ESTRESSE OCUPACIONAL: ESTUDO COM MAGISTRADOS TRABALHISTAS. Caderno De Administração, 30(1), 81-101.

3HAN, Byung-Chul. Sociedade do cansaço. Petrópolis-RJ: Vozes, 2017

4FERRITO, Bárbara. Direito e desigualdade: uma análise da discriminação das mulheres no mercado de trabalho a partir dos usos dos tempos. São Paulo: Ltr, 2021.

A saúde é direito de todos e dever do Estado (Constituição Federal, art. 196), e a Constituição Federal, em sintonia com a Convenção n. 155 da OIT, assegura a todas pessoas trabalhadoras, independentemente do regime jurídico a que estejam submetidas, o direito à redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança (Constituição Federal, art. 7º, XXII, combinado com o art. 39, § 3º). O direito ao trabalho é categoria de direitos humanos fundamentais, previsto no art. 23 da Declaração Universal dos Direitos Humanos, assim como em outros instrumentos normativos. Ademais, é dever constitucional a proteção ao meio ambiente, nele incluído o de trabalho (Constituição Federal, art. 170, VI e 225, caput, e § 1º, V e VI).

 A Constituição Federal de 1988 estabelece o dever de prevenção em artigo 7º, incisos XXII e XXVIII, derivando do texto constitucional o direito de todas as pessoas trabalhadoras, independentemente do regime jurídico a que estejam submetidas, à redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança; extraindo-se também da interpretação do art. 225 da Carta Política o direito ao meio ambiente de trabalho seguro e saudável.

 Para além da Convenção n. 155 da OIT, ratificada pelo Brasil, a 110.ª Conferência Internacional do Trabalho da OIT incluiu segurança e saúde aos Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho, e de acordo com os princípios das Nações Unidas, da OMS e da OIT, todas as pessoas cidadãs do mundo têm o direito a um trabalho seguro e saudável e a um ambiente de trabalho que lhes permita ter uma vida produtiva do ponto de vista social e econômico. Integrando o núcleo de direitos trabalhistas fundamentais, o direito fundamental a um ambiente de trabalho seguro e saudável, tenham ou não ratificado as Convenções relevantes, constituem compromisso do estado brasileiro a ser respeitado e promovido em âmbito da iniciativa privada e no contexto de atividades prestadas nos serviços públicos, assim considerados em sentido amplo, para também incluir agentes políticos e categoria de magistradas e magistrados trabalhistas.

 Compreendendo a saúde como estado de completo bem-estar físico, mental e social, e não apenas a ausência de doenças, compete à Administração Pública adotar medidas necessárias à efetivação do princípio da proteção integral à saúde e à dignidade da pessoa humana, incluindo a readaptação profissional como direito conexo à saúde, em face da centralidade do trabalho na vida e na sociabilidade de pessoas trabalhadoras, incluindo magistradas e magistrados trabalhistas.

 Quanto à readaptação profissional, entende-se haver lacuna em LOMAN, sendo sabido que, a respeito de limitações para o trabalho por motivo de saúde, é disciplinando sucintamente a Lei n. 8.112/90, estabelecendo que a readaptação ocorre com ocupação em cargo de atribuições e responsabilidades compatíveis com a limitação que tenha sofrido o(a) servidor(a) em sua capacidade física ou psíquica, verificada em inspeção médica (art. 24), sendo expressa ao regular que na readaptação será respeitada, entre outros, a equivalência de vencimentos.

 Necessário demarcar que os sentidos de ergonomia compõem todas as dimensões do ser humano em suas relações de trabalho, incluindo os aspectos psicossociais, as evoluções tecnológicas e dos processos de trabalho (Resolução CSJT n. 141/2014), bem como que desde 2015 o CNJ instituiu a Política de Atenção Integral à Saúde de Magistrados e Servidores do Poder Judiciário (Res. CNJ 207/2015).

 De outro lado, situações de exigência de alta produtividade, sob condições inadequadas, a exemplo de estruturas precárias, prazos limitados, tensão emocional ou excesso de horas de trabalho, podem contribuir para esgotamento físico e psíquico do indivíduo. Assim, atividades que demandam grande esforço de concentração, alto desempenho intelectual e controle emocional também se inserem naquelas de riscos psicossociais, caso da magistratura.

 Com relação à magistratura, tem se ampliado o número de magistradas e magistrados afastados ou sob tratamento de problemas de saúde relacionados a questões físicas e notadamente psíquicas. Cite-se como exemplo o estudo do CNJ em relação ao adoecimento psíquico em 2020, disponível em <https://www.cnj.jus.br/wp-content/uploads/2020/08/WEB_RELATORIO_SAUDE_MENTAL_COVID_V2.pdf> acesso 13 mar. 2024.

 Registre-se que estudo realizado com magistradas e magistrados trabalhistas (TRT5/Bahia) para investigação de estresse ocupacional, resultados encontrados entre participantes apontaram que as fontes de tensão excessivas no trabalho estão relacionadas ao elevado número de audiências realizadas e sentenças proferidas, identificando-se também situações como o isolamento, o peso emocional do julgamento, além do ônus da responsabilidade sobre a liderança em relação às atividades administrativas e de gestão, acrescidos da competitividade entre os pares, indicada pela maioria dos pesquisados, determinando sintomas de estresse relacionados a insônia, irritabilidade excessiva, cefaleia, depressão, diminuição da libido e disfunções sexuais (MAGALHÃES, Samildes Silva; NASCIMENTO-SANTOS, Jair; ZILLE, Luciano Pereira. ESTRESSE OCUPACIONAL: ESTUDO COM MAGISTRADOS TRABALHISTAS. Caderno De Administração, 30(1), 81-101. Disponível em <https://periodicos.uem.br/ojs/index.php/CadAdm/article/view/60791> acesso 03 mar. 2024).

 Além disso, da análise dos resultados da pesquisa “Trabalho, Saúde e Qualidade de Vida de Magistrados Trabalhistas do TRT/RJ: Uma Perspectiva Geracional”, investigando a organização do trabalho e utilização das novas tecnologias informacionais, examinando o PJE e a gestão por metas, considerando elementos da nova organização do trabalho produtivista, identifica que a gestão por metas é elemento de desprofissionalização que causa a precarização subjetiva do(a) magistrado(a), tensionando a própria autonomia profissional na realização do trabalho, de forma que o trabalho do(a) magistrado(a), tal como está organizado no presente, ameaça não apenas a saúde do(a) magistrado(a) – principalmente de juízas e juízes substitutos, mas também a qualidade das sentenças, compelindo, com distinções geracionais, o(a) magistrado(a) para escolhas para se defender da insalubridade organizacional, driblando o adoecimento físico e psíquico. Destaca o estudo, entro outros, que o grau de intensificação do trabalho (quantitativo no que diz respeito a metas) e o grau de exigências qualitativas (complexidade) da matéria a ser trabalhada estão entre elementos que em maior ou menor medida impactam no processo saúde-doença naquilo que diz respeito à qualidade de vida no trabalho ou qualidade do trabalho (ALVES, Giovanni Antonio Pinto; HELOANI, José Roberto; RIBEIRO, Bruno Chapadeiro. Trabalho, Saúde e Qualidade de Vida de Magistrados Trabalhistas do TRT/RJ: Uma Perspectiva Geracional. Disponível em <https://www.trt1.jus.br/documents/38860/25322494/ARTIGO+TRT1+revisto.pdf/517203d8-f19e-6cf0-c89c-31b8291ae0ee> acesso 03 mar. 2024).

 Isso exposto, deve a Administração Pública, respeitada a necessidade de participação do/a magistrado/a e de equipe multidisciplinar, adotar medidas necessárias à efetivação do princípio da proteção integral à saúde e à dignidade da pessoa humana, regulamentando a readaptação profissional para magistradas e magistrados trabalhistas, observando as peculiaridades da atividade jurisdicional, diretrizes da Resolução n. 141/2014 do CSJT e da Política de Atenção Integral à Saúde de Magistrados e Servidores do Poder Judiciário do CNJ, especialmente os princípios da i) universalidade e transversalidade de ações; ii) abordagem biopsicossocial do processo saúde/doença; iii) integralidade das ações em saúde; iv) democratização da governança das ações em saúde; v) intra e intersetorialidade das ações em saúde.

 Magistradas e magistrados, portanto, tem direito à regulamentação de readaptação profissional como derivação do princípio da dignidade da pessoa humana, do direito fundamental à saúde, ao trabalho e à proteção ao meio ambiente do trabalho, observando a sua participação no procedimento, de equipe multidisciplinar e a adoção de medidas necessárias ao acolhimento humanizado daqueles/as que tenham passado ou estejam passando por tratamentos e/ou afastamentos em decorrência de adoecimento físico ou psíquico, inclusive, a depender do caso, com a possibilidade de adaptação, redução de atividades, e/ou teletrabalho, assegurando o retorno gradual ao trabalho, permitindo a continuidade de tratamentos, tudo de forma colaborar para o restabelecimento de sua saúde.

 Diante disso, deverá a ANAMATRA empenhar esforços para que a Administração Pública adote medidas necessárias à efetivação do princípio da proteção integral à saúde e à dignidade da pessoa humana, regulamentando no âmbito da Justiça do Trabalho a readaptação profissional para magistradas e magistrados trabalhistas, na forma da fundamentação retro.

Está assegurada às mulheres magistradas a opção pelo regime de teletrabalho quando a mesma for vítima de violência doméstica ou um de seus familiares; b) A Lei Maria da Penha, cujo desiderato é proteger a integridade física e moral da mulher e seus dependentes determina que o Estado deverá assegurar as condições para o exercício profissional das mulheres (artigo 3º, §1º da Lei 11.340/2006), o que autoriza a preservação da antiguidade da magistrada que precisar residir em comarca diversa em razão de violência doméstica; II – Há compatibilidade entre o preceituado pela Lei Maria da Penha e a Lomam, uma vez já decidido pelo Conselho Nacional de Justiça, ao apreciar Resolução editada pelo Tribunal Regional Federal da 2ª Região, ser possível em casos específicos que o magistrado ou a magistrada residam fora da comarca; III – Devem os Tribunais do Trabalho observar a Resolução 37 do CNJ e regulamentarem a situação, especificamente nos casos de violência praticada contra mulheres magistradas e seus familiares; IV – A preservação da antiguidade das magistradas vítimas de violência preserva a dignidade das mesmas e promove a igualdade na carreira.

Autorização para o teletrabalho após o período de licença-maternidade de 180 dias e de licença paternidade de 5 dias, por até dois anos para a mãe e 180 dias para o pai nos casos de nascimento múltiplo (mais de um filho na mesma gestação) e nascimento prematuro, pois o nascimento em tais condições exige dos pais maior atenção e cuidados que os normalmente dispensados ao recém-nascido em circunstâncias normais.

O exercício da parentalidade com equidade é fundamental para a criação e o bom desenvolvimento de uma criança.

Neste aspecto, havendo o nascimento de um (uma) filho (filha) prematuro(a) ou o nascimento de múltiplos autoriza, para o melhor exercício da maternidade, o trabalho da magistrada e servidora no regime de teletrabalho, até que a criança alcance a idade de 2 anos. Para os pais, magistrados e servidores, autoriza o teletrabalho por até 180 dias, o que permitirá a paternagem (que significa suprir as necessidades físicas e emocionais dos filhos, o que inclui cuidados com alimentação, higiene, saúde, amparo e doação de afeto) e o auxílio constante dentro do lar ao(s) filhos(s) e o suporte necessário à mãe, de quem a criança sempre exige presença constante, para amamentar e zelar pelo seu cuidado e desenvolvimento.

Assim, a presença da mãe e do pai por período de tempo mais elastecido junto ao(s) filho(s), sem que estes tenham que se ausentar para o trabalho, muitas vezes percorrendo longas distâncias, como é comum aos juízas/juízes e servidoras/servidores que, não raras vezes, residem em locais diferentes de sua lotação, permitirá que o(s) filho(s) receba(m) maior atenção e cuidado, sem que haja prejuízo à prestação dos serviços relacionados à jurisdição e às funções institucionais da magistrada e do magistrado, bem como da servidora e do servidor.

A permanência em teletrabalho, sem acréscimo de produtividade de que trata a Resolução CNJ nº 227/2016, não causará prejuízo aos Tribunais, ao bom andamento dos serviços, não exigirá a contratação e novos juízas/juízes e servidoras/servidores, não implicará em aumento de gastos e assegurará o contato pleno e o acompanhamento do desenvolvimento do(s) filho(s) nas situações acima indicadas.

A Carta Magna tem a igualdade como princípio e objetivo fundamental da República Federativa do Brasil, o que implica na necessidade de promover e proteger os direitos humanos de
todas as pessoas, em igualdade de condições, sem preconceitos de raça, gênero, idade e quaisquer outras formas de discriminação.

O Poder Judiciário brasileiro aderiu ao “Pacto pela Implementação da Agenda 2030”, que tem por Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) a igualdade de gênero (ODS 5), o
trabalho digno e crescimento econômico (ODS 8), a redução das desigualdades (ODS 10), paz, justiça e instituições eficazes (ODS 16) entre outros.

A Resolução do CNJ nº 492, de 17 de março de 2022, estipula a adoção de Perspectiva de Gênero nos julgamentos em todo o Poder Judiciário, com base nas diretrizes do
protocolo aprovado pelo Grupo de Trabalho constituído pela Portaria CNJ n. 27/2021, e institui a obrigatoriedade de capacitação de magistrados e magistradas, relacionada a direitos humanos,
gênero, raça e etnia, em perspectiva interseccional.

A Resolução do CSJT nº 368, de 27 de outubro de 2023 estabelece o Programa de Equidade de Raça, Gênero e Diversidade no âmbito da Justiça do Trabalho.

Portanto, é necessário o conhecimento prévio do Protocolo para julgamento com perspectiva interseccional de gênero e raça, pelo magistrado ou magistrada que se candidata à vaga
de tamanha importância nos Comitês. A exigência de tal requisito, ademais, torna efetiva a Resolução 492/2022 do CNJ, no tocante à qualificação da magistratura em temas relacionados aos
direitos humanos, gênero, raça e etnia, em perspectiva interseccional.

A sociedade brasileira conviveu até muito pouco tempo atrás com a normalização de comentários infelizes e maldosos de natureza homofóbica, transfóbica ou que, de alguma outra forma, diminuíssem ou menosprezassem a pessoa somente por sua orientação sexual ou pela manifestação do desejo de viver e ser aceito como membro do gênero oposto daquele que recebeu ao nascer.

O número alarmante no Brasil de atos de violência contra pessoas da comunidade LGBTQIAPN+, somado ao próprio reconhecimento pelo STF da criminalização do crime de homofobia e transfobia (ADO 26), impõem, contudo, uma mudança de paradigma cultural na sociedade brasileira, que se reflete na necessidade de repelir e coibir de pronto qualquer palavra, gesto ou outro sinal que possam caracterizar discriminação ou preconceito por motivo de orientação sexual, como também para adotar medidas ativas a fim de permitir a livre manifestação do direito à autodeterminação em toda sua plenitude.

Dentro dessa perspectiva, e considerando o silêncio legislativo específico sobre a matéria, a proposta em questão visa reconhecer o direito da pessoa trans de utilizar seu nome social no crachá e nos demais registros da empresa onde trabalha, mesmo sem a realização de procedimento cirúrgico de redesignação de sexo ou conclusão dos trâmites judiciais para alteração do registro civil com o uso do nome social. Propõe-se, ainda, reconhecer que a violação injustificada pelo empregador do uso do nome social no crachá configura dano indenizável ao empregado trans, que decorre ipso facto da situações traumática e constrangedora a que foi submetido, trazendo-lhe perturbação em sua autoestima, além de aflições, angústias e desequilíbrio em seu bem-estar que-

Ressalto que a questão já foi reconhecida como tese de repercussão geral (Tema 778), ainda pendente de julgamento do mérito.

Por fim, cito ementa do c. Tribunal Superior do Trabalho na mesma linha do entendimento defendido na proposta:

RECURSO DE REVISTA. REGIDO PELA LEI 13.015/2014. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. PESSOA TRANSGÊNERO. PROIBIÇÃO DE USO DO NOME SOCIAL NO CRACHÁ. VEDAÇÃO DO USO DO BANHEIRO FEMININO. TEMAS 761 E 778 DA TABELA DE REPERCUSSÃO GERAL DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. INEXIGIBILIDADE DE CIRURGIA DE REDESIGNAÇÃO SEXUAL. DIREITO À IDENTIDADE INDIVIDUAL E SOCIAL. EFICÁCIA HORIZONTAL DOS DIREITOS HUMANOS. PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. DIREITOS DE PERSONALIDADE. VIOLAÇÃO DOS ARTIGOS 1º, III, 5º, CAPUT E X DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. CONFIGURAÇÃO (RR-11190-88.2015.5.15.0131, 5ª Turma, Relator Ministro Douglas Alencar Rodrigues, DEJT 08/03/2024).

No final do século XX, com as transformações culturais, sociais, reprodutivas e educacionais, e a consequente ampliação da participação feminina no mercado de trabalho, as mulheres passam a exercer cumulativamente suas atividades profissionais com as atividades de cuidado do lar e dos familiares.

Observa-se no Brasil a manutenção do familismo como modelo vigente na prática e nas políticas sociais de cuidado, perpetuando as unidades familiares como principais responsáveis pelo cuidado e bem-estar de seus membros. Esta política social encontra respaldo no caput dos arts. 227 e 230 da Constituição Federal, através dos quais se depreende uma ordem de responsabilidade pelo cuidado de crianças, adolescentes e idosos: família, sociedade e, finalmente, Estado.

Em 2021 o IBGE divulgou o relatório denominado “Estatísticas de Gênero – Indicadores Sociais das mulheres no Brasil (2ª edição)”¹, o qual apontou que em relação a cuidados de pessoas ou afazeres domésticos, as mulheres dedicaram quase o dobro de tempo que os homens: 21,4 horas contra 11 horas semanais. A presença das mulheres no mundo do trabalho ainda possui a maternidade como elemento central, já que é definida pelas condições que elas têm para conciliar o trabalho assalariado com o trabalho doméstico de cuidado, o que além de ser fonte angústia e conflito para as mulheres, lhes coloca em uma posição de ter que renunciar à carreira ou à maternidade, o que também reflete na saúde psíquica da mulher trabalhadora.

Um estudo realizado pela Escola Brasileira de Economia e Finanças da Fundação Getúlio Vargas (FGV EPGE) apontou que após 24 meses, 48% das mulheres que tiram licença-maternidade está fora do mercado de trabalho, um padrão que se perpetua inclusive 47 meses após a licença². Corroborando os demais achados, o relatório do IBGE “Estatísticas de Gênero – Indicadores Sociais das mulheres no Brasil (2ª edição)”, apontou que no ano de 2019 a taxa de participação das mulheres com 15 anos ou mais de idade foi de 54,5%, enquanto entre os homens esta medida chegou a 73,7%, uma diferença de 19,2 pontos percentuais. A diferença se acentua nos lares em que existem mulheres de 25 a 49 anos vivendo com crianças de até 3 anos de idade, onde o nível de ocupação foi de 54,6%, enquanto o dos homens, na mesma situação, foi de 89,2%. Percebe-se, facilmente, que a existência de uma criança na primeira infância em uma residência, gera efeitos diversos para homens e mulheres quanto à inserção produtiva.

A Resolução n.º 492/2023 do CNJ, tornou vinculante para a Magistratura a adoção das diretrizes do Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero, relevante instrumento jurídico que abarca considerações teóricas sobre gênero, discriminação e igualdade; e contém um guia para que os julgamentos ocorridos nos diversos âmbitos da Justiça efetivem o direito à igualdade e à não discriminação, sendo mais um instrumento de alcance da igualdade de gênero.

Portanto, como consequência direta da divisão sexual do trabalho tem-se que a maternidade é vista de maneira estigmatizada, colocando as mulheres à margem do mercado de trabalho, gerando concretamente assimetrias e desigualdades de gênero. Aplica-se, por analogia, a previsão contida na Súmula n.º 443 do TST, presumindo-se discriminatória a despedida de empregadas gestantes ou mães que retornam ao trabalho após o gozo da licença maternidade, ainda que vencido o período de estabilidade previsto no art. 10, II, b do ADCT.

1IBGE. Estatísticas de Gênero Indicadores sociais das mulheres no Brasil. 2ª Edição. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE, 2021. Disponível em: https://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/livros/liv101784_informativo.pdf . Acessado em 05 out 2022.

2 MACHADO, Cecilia; PINHO NETO, Valdemar Rodrigues de. The labor market consequences of maternity leave policies: evidence from Brazil. 2016.

A Organização Mundial de Saúde (OMS) incentiva a amamentação durante os dois primeiros anos de vida da criança, sendo, de forma exclusiva, nos seis primeiros meses, uma vez que o leite materno contém anticorpos que ajudam na proteção contra doenças comuns na infância, reduzindo a mortalidade infantil, além de trazer benefícios para a mulher lactante, reduzindo o risco de câncer de ovário e de mama (https://www.paho.org/pt/noticias/29-7-2021-opas-destaca-importancia-participacao-toda-sociedade-na-promocao-do-aleitamento ).

As magistradas substitutas sem designação fixa, possuem rotina de trabalho diferenciada, implicando em viagens frequentes e longos deslocamentos para atender às convocações, as quais podem ocorrer repentinamente, impedindo ou dificultando o prosseguimento do aleitamento materno, quando do retorno após a licença maternidade.

A Resolução n.º 343 do CNJ prevê em seu art. 1º, §1º-A, a possibilidade de concessão de condições especiais de trabalho às magistradas gestantes e lactantes, dentre elas o exercício da atividade em regime de teletrabalho, sem acréscimo de produtividade (art. 2º, IV).

No XX Conamat, restou aprovada a tese n.º 48, dispondo que cabe às Administrações dos Tribunais garantir às magistradas lactantes o exercício do direito de amamentação, implementando rotinas de trabalho que observem as necessidades específicas de cada magistrada após o retorno da licença-maternidade, incluindo-se a prerrogativa de realização de audiências na modalidade telepresencial ou a autorização para trabalho remoto e a atuação no Juízo 100% Digital.

Considerando as peculiaridades envolvidas na rotina de trabalho das magistradas substitutas sem designação fixa e levando-se em conta a adoção das lentes da perspectiva de gênero, deverão as Administrações dos Tribunais concederem às magistradas substitutas sem designação fixa, condições especiais de trabalho, em especial, a realização de audiências na modalidade telepresencial ou a autorização para trabalho remoto e a atuação no Juízo 100% Digital, sempre que forem requeridas, por se tratarem de medidas capazes de compatibilizar o exercício da jurisdição com o direito de amamentação.

Tal medida atende à aplicação do Protocolo de Julgamento com Perspectiva de Gênero e das Resoluções n.º 492/2023, 343/2020, 254/2018 e 255/2018 do CNJ, concretizando a garantia fundamental prevista expressamente na Constituição Federal de proteção à maternidade e à infância (art. 6º  da CF/88) e à proteção integral e prioridade absoluta (art. 227, CF/88), devendo a Anamatra atuar para efetivação de direito à amamentação para magistradas trabalhistas sem designação fixa.

Cada TRT tem sua norma e alguns chegam a exigir perícia de amamentação, o que se resolve com a presunção que se tem por estudos de entidades científicas ou laudos de profissionais que
acompanham a lactante (prova documental).

Impõe-se a Regulamentação uniforme tanto para a Magistratura do Trabalho a nível Nacional (perante o CSJT), como, em maior escala, para toda a Magistratura Brasileira (perante o CNJ), para evitar discricionariedades que atentam contra a equidade, isonomia, e dignidade das mulheres juízas, principalmente daquelas que moram no interior, distantes das Sedes dos Tribunais.

Conforme a Declaração Universal dos Direitos Humanos, “toda a pessoa tem direito ao trabalho, à livre escolha do trabalho, a condições equitativas e satisfatórias de trabalho e à proteção contra o desemprego. Todos têm direito, sem discriminação alguma, a salário igual por trabalho igual. Quem trabalha tem direito a uma remuneração equitativa e satisfatória, que lhe permita e à sua família uma existência conforme com a dignidade humana, e completada, se possível, por todos os outros meios de proteção social. Toda a pessoa tem o direito de fundar com outras pessoas sindicatos e de se filiar em sindicatos para defesa dos seus interesses (Artigo 23)”.

Para se estancar o movimento atual de regressão civilizatória no desenvolvimento e na regulação do labor tal qual verificada nos novos contornos da relação de trabalho, torna-se imprescindível ter a percepção da centralidade de todo e qualquer trabalho do indivíduo para o desenvolvimento social e econômico, a partir de sua fundamentabilidade enquanto direito humano, de modo a assegurar a plena cidadania em sociedade. Trata-se aqui, em última análise, de salvaguardar para todas e todos uma existência compatível com a dignidade humana, sustentando a garantia de um trabalho jurídica e socialmente qualificado como decente, pela construção de modelo econômico sustentável, que permita e fomente a geração de empregos e de postos de trabalho na plena formalidade, com proteção social no Estado Democrático de Direito.

Neste sentido, a especialização da competência do Judiciário brasileiro em matéria trabalhista, para além do contexto histórico de sua criação na primeira metade do século passado, rejuvenesce e atualiza-se tecnicamente no cenário desafiante de crescente complexidade e da reformatação das relações de trabalho, em suas múltiplas formas, que recalibram a assimetria nos novos contratos em parâmetros por vezes mais agressivos, em prejuízo da garantia do trabalho decente. Cabe à Justiça do Trabalho, portanto, concretizar o patamar civilizatório de proteção constitucional do direito humano ao trabalho, a partir da prevalência da relação harmônica entre os valores sociais do trabalho e também da livre iniciativa, na interpretação e na aplicação da regulação estatal, inclusive e especialmente diante das tentativas de fraude à legislação trabalhista.

A Reclamação é o remédio constitucional de natureza mandamental que tem por fim preservar a competência e a autoridade das decisões do STF e dos tribunais. No âmbito do STF, a reclamação encontra regulamentação na CF, art. 102, I e art. 103-A, §3º.

É cabível nas seguintes situações, conforme prevê o art. 988 e incisos do CPC:
a) para preservar a competência do tribunal;
b) para garantir a autoridade das decisões do tribunal;
c) para garantir a observância de enunciado de súmula vinculante e de decisão do Supremo Tribunal; Federal em controle concentrado de constitucionalidade;
d) para garantir a observância de acórdão proferido em julgamento de incidente de resolução de demandas repetitivas ou de incidente de assunção de competência.

De acordo com precedentes do próprio STF, são pressupostos necessários e cumulativos ao cabimento da reclamação:
a) o esgotamento das instâncias ordinárias;
b) a interposição de agravo interno da decisão monocrática que sobresta o feito, inadmite liminarmente o Recurso da competência do STF ou julga-o prejudicado; e
c) a plausibilidade na tese de erronia na aplicação do entendimento do Supremo firmado na repercussão geral pelo Juízo a quo.

Ainda, conforme o disposto no art. 988, § 5º , I e II, do CPC, é inadmissível a reclamação proposta após o trânsito em julgado da decisão reclamada ou proposta para garantir a observância de acórdão de recurso extraordinário com repercussão geral reconhecida ou de acórdão proferido em julgamento de recursos extraordinário ou especial repetitivos, quando não esgotadas as instâncias ordinárias. O vínculo de emprego, por sua vez,  é declarado quando presentes os requisitos da relação de emprego, o que ocorre nas instâncias ordinárias pela apreciação do modo de desenvolvimento da atividade - subordinação objetiva.

A reclamação constitucional não pode ser utilizada como instrumento processual para revolvimento de fatos e provas. Também não pode ser utilizada como sucedâneo recursal. Nessa hipótese, é inadmissível a reclamação constitucional, na medida em que o seu cabimento  exige o preenchimento dos requisitos formais sem invasão da esfera material da decisão pelas instâncias trabalhistas. 

Houve momento no direito do trabalho em que se relacionava a terceirização com o modelo de trabalho que leva à precarização.

Não poderia ser diferente, porque a contratação de trabalhadores e trabalhadoras por via transversa, de forma intermediada, em efetiva locação de mão de obra, em que interessa basicamente a força de trabalho, relegando a segundo plano o ser humano trabalhador, importa na descaraterização do vínculo de emprego, que se forma entre o tomador da mão de obra, o empregador, e a pessoa natural do trabalhador, com vários e conhecidos reflexos negativos na vida profissional do trabalhador.

A Justiça do Trabalho muito discutiu os modelos de terceirização, na origem de toda essa discussão chegou a declarar a completa nulidade dos contratos de trabalho de terceirização na importante Súmula 256 do TST que assim dizia, verbis:

“CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. LEGALIDADE.

Salvo os casos de trabalho temporário e de serviço de vigilância, previstos nas Leis nºs 6.019, de 03.01.1974, e 7.102, de 20.06.1983, é ilegal a contratação de trabalhadores por empresa interposta, formando-se o vínculo empregatício diretamente com o tomador dos serviços.”

A Súmula 256 incorporava a essência do direito do trabalho, expressando o que parecia ser o óbvio ululante, não permitindo que viesse assumir contornos jurídicos a contratação empregatícia triangular, dizendo a toda clareza tratar-se de fraude à legislação trabalhista, onde o verdadeiro tomador da mão de obra aparece de forma encoberta, simulada.

Excepcionava os casos de contratação de serviços de vigilância e ainda os de contrato de trabalho temporário, cujas leis de regência exigem a presença de empregador específico.

O vigilante pelas peculiaridades da sua profissão, portando arma de fogo, notoriamente necessita de controle especial e regramento específico, inclusive através de cursos próprios para o exercício da profissão, não sendo desejável que o empregador comum viesse dispor de todo esse aparato exigido pela Lei, entre outras situações sujeitando-se à fiscalização da Polícia Federal para efeito de alvará de funcionamento.

Na mesma medida o trabalho temporário, a Lei que o regula estabelece a necessidade de contratação entre empresas, estabelecendo que a contratação de trabalhador temporário se faça necessariamente por meio de empresas especializadas em mão de obra temporária.

Com essas duas exceções, a Súmula 256 proclamava a completa nulidade dos contratos de trabalho terceirizados.

Diante da pressão de grupos econômicos, o TST, em 1993, veio cancelar a Súmula 256 e em seu lugar surgiu a Súmula 331, passando o TST a incorporar em sua jurisprudência os efeitos jurídicos desse fenômeno econômico que se mostrava presente em todos os setores empresariais, a terceirização.

Originalmente, a Súmula 331 instituía a responsabilidade subsidiária do tomador da mão de obra e proclamava a nulidade dos contratos de trabalhos efetivados pela terceirização, com exceção dos dois casos já mencionados, independente tratar-se de atividade fim ou atividade meio, cuja distinção somente veio surgir em 2011.

Foi assim estabelecida, verbis:

“SUM-331 CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. LEGALIDADE (nova redação do item IV e inseridos os itens V e VI à redação) - Res. 174/2011, DEJT divulgado em 27, 30 e 31.05.2011

I - A contratação de trabalhadores por empresa interposta é ilegal, formandose o vínculo diretamente com o tomador dos serviços, salvo no caso de trabalho temporário (Lei nº 6.019, de 03.01.1974).

II - A contratação irregular de trabalhador, mediante empresa interposta, não gera vínculo de emprego com os órgãos da Administração Pública direta, indireta ou fundacional (art. 37, II, da CF/1988).

III - Não forma vínculo de emprego com o tomador a contratação de serviços de vigilância (Lei nº 7.102, de 20.06.1983) e de conservação e limpeza, bem como a de serviços especializados ligados à atividade-meio do tomador, desde que inexistente a pessoalidade e a subordinação direta.

IV - O inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica a responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços quanto àquelas obrigações, desde que haja participado da relação processual e conste também do título executivo judicial.

V - Os entes integrantes da Administração Pública direta e indireta respondem subsidiariamente, nas mesmas condições do item IV, caso evidenciada a sua conduta culposa no cumprimento das obrigações da Lei n.º 8.666, de 21.06.1993, especialmente na fiscalização do cumprimento das obrigações contratuais e legais da prestadora de serviço como empregadora. A aludida responsabilidade não decorre de mero inadimplemento das obrigações trabalhistas assumidas pela empresa regularmente contratada.

VI – A responsabilidade subsidiária do tomador de serviços abrange todas as verbas decorrentes da condenação referentes ao período da prestação laboral.

Histórico: Súmula mantida - Res. 121/2003, DJ 19, 20 e 21.11.2003 Súmula alterada (inciso IV) - Res. 96/2000, DJ 18, 19 e 20.09.2000 Nº 331 (...) IV - O inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica a res-ponsabilidade subsidiária do tomador dos serviços, quanto àquelas obrigações, inclusive quanto aos órgãos da administração direta, das autarquias, das fundações públicas, das em-presas públicas e das sociedades de economia mista, desde que hajam participado da relação processual e constem também do título executivo judicial (art. 71 da Lei nº 8.666, de 21.06.1993). Redação original (revisão da Súmula nº 256) - Res. 23/1993, DJ 21, 28.12.1993 e 04.01.1994 Nº 331 (...) II - A contratação irregular de trabalhador, através de empresa interposta, não gera vínculo de emprego com os órgãos da Administração Pública Direta, Indireta ou Fundacional (art. 37, II, da Constituição da República). (...) IV - O inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica na responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços, quanto àquelas obrigações, desde que hajam participado da relação processual e constem também do título executivo judicial.”

Em outro momento, novamente sob o impacto de pressões econômicas crescentes se veio estabelecer a distinção entre atividade empresarial meio e atividade principal, ou fim, permitindo-se a terceirização nas primeiras, o que somente surgiu em 2011.

Portanto, foram necessários muitos anos de discussão para que se chegasse ao modelo jurídico que permitiu manter-se a higidez dos princípios básicos do direito do trabalho, em que a terceirização se encontrava restrita a atividades meio, sempre com a presença forte e marcante da responsabilidade subsidiária.

A quadra histórica que veio determinar o impeachmaent da Presidenta Dilma Roussef, desencadeou no sistema jurídico trabalhista maior ênfase ao liberalismo econômico com reflexos em toda sociedade, sobretudo na condição social do trabalhador.

Sob fortes pressões do setor econômico, se resolveu deliberar pela permissão ampla de se adotar a terceirização em toda atividade empresarial, sobretudo na atividade principal da empresa.

A permissão se fez primeiramente através da jurisprudência do STF, através do Tema 725, e depois por via legislativa através da Lei 13.467 de 2017.

E o que se observa a partir deste momento são precedentes do próprio STF que agravam ainda mais a condição do trabalhador, confundindo de forma preocupante a terceirização com formais mais avançadas de simulação e fraude do contrato de trabalho, em casos envolvendo a “pejotização”, quando o trabalhador se insere na empresa por meio de pessoa jurídica adredemente constituída, apenas para burlar a legislação trabalhista.

O STF, reiteradamente, tem acolhido reclamação por descumprimento a suas decisões, proclamando a liberdade individual de contratação, expressamente afirmando que cabe ao empregador determinar o regime jurídico da contratação do empregado.

Recentemente na RECLAMAÇÃO 64.763 DISTRITO FEDERAL nos autos de 0000029-
57.2021.5.10.001 que tem como reclamada a Prudential Brasil Seguros de Vida S/A, que teve o Min Dias Tofoli como relator, de 26 de janeiro último, em que se referência ao Tema 725 do STF, cassou-se decisão da Segunda Turma do TRT/10 que havia determinar o reconhecimento do vínculo empregatício.

Em tantas outras situações assim tem procedido, investindo diretamente contra a Justiça do Trabalho e a sua competência de aplicar às relações de trabalho de pessoas naturais a regência da CLT.

Por isso, se afigura importante que se diga que a terceirização, embora não venha representar um avanço no campo do direito do trabalho, não pode ser confundida com fraude direta à legislação do trabalho por meio do uso indevido e simulado da pessoa jurídica, por pessoa natural que presta trabalho com a presença de todos os elementos legais que caracterizam o vínculo de emprego.

A Reclamação é o remédio constitucional de natureza mandamental que tem por fim preservar a competência e a autoridade das decisões do STF e dos tribunais. No âmbito do STF, a reclamação encontra regulamentação na CF, art. 102, I e art. 103-A, §3º.

É cabível nas seguintes situações, conforme prevê o art. 988 e incisos do CPC:

a) para preservar a competência do tribunal;

b) para garantir a autoridade das decisões do tribunal;

c) para garantir a observância de enunciado de súmula vinculante e de decisão do Supremo Tribunal; Federal em controle concentrado de constitucionalidade;

d) para garantir a observância de acórdão proferido em julgamento de incidente de resolução de demandas repetitivas ou de incidente de assunção de competência.

De acordo com precedentes do próprio STF, são pressupostos necessários e cumulativos ao cabimento da reclamação:

a) o esgotamento das instâncias ordinárias;

b) a interposição de agravo interno da decisão monocrática que sobresta o feito, inadmite liminarmente o Recurso da competência do STF ou julga-o prejudicado; e

c) a plausibilidade na tese de erronia na aplicação do entendimento do Supremo firmado na repercussão geral pelo Juízo a quo.

Ainda, conforme o disposto no art. 988, § 5º , I e II, do CPC, é inadmissível a reclamação proposta após o trânsito em julgado da decisão reclamada ou proposta para garantir a observância de acórdão de recurso extraordinário com repercussão geral reconhecida ou de acórdão proferido em julgamento de recursos extraordinário ou especial repetitivos, quando não esgotadas as instâncias ordinárias. O vínculo de emprego, por sua vez,  é declarado quando presentes os requisitos da relação de emprego, o que ocorre nas instâncias ordinárias pela apreciação do modo de desenvolvimento da atividade - subordinação objetiva.

A reclamação constitucional não pode ser utilizada como instrumento processual para revolvimento de fatos e provas. Também não pode ser utilizada como sucedâneo recursal. Nessa hipótese, é inadmissível a reclamação constitucional, na medida em que o seu cabimento  exige o preenchimento dos requisitos formais sem invasão da esfera material da decisão pelas instâncias trabalhistas.

A Reclamação é o remédio constitucional de natureza mandamental que tem por fim preservar a competência e a autoridade das decisões do STF e dos tribunais. No âmbito do STF, a reclamação encontra regulamentação na CF, art. 102, I e art. 103-A, §3º.

É cabível nas seguintes situações, conforme prevê o art. 988 e incisos do CPC:

a) para preservar a competência do tribunal;

b) para garantir a autoridade das decisões do tribunal;

c) para garantir a observância de enunciado de súmula vinculante e de decisão do Supremo Tribunal; Federal em controle concentrado de constitucionalidade;

d) para garantir a observância de acórdão proferido em julgamento de incidente de resolução de demandas repetitivas ou de incidente de assunção de competência.

De acordo com precedentes do próprio STF, são pressupostos necessários e cumulativos ao cabimento da reclamação:

a) o esgotamento das instâncias ordinárias;

b) a interposição de agravo interno da decisão monocrática que sobresta o feito, inadmite liminarmente o Recurso da competência do STF ou julga-o prejudicado; e

c) a plausibilidade na tese de erronia na aplicação do entendimento do Supremo firmado na repercussão geral pelo Juízo a quo.

Ainda, conforme o disposto no art. 988, § 5º , I e II, do CPC, é inadmissível a reclamação proposta após o trânsito em julgado da decisão reclamada ou proposta para garantir a observância de acórdão de recurso extraordinário com repercussão geral reconhecida ou de acórdão proferido em julgamento de recursos extraordinário ou especial repetitivos, quando não esgotadas as instâncias ordinárias. O vínculo de emprego, por sua vez,  é declarado quando presentes os requisitos da relação de emprego, o que ocorre nas instâncias ordinárias pela apreciação do modo de desenvolvimento da atividade - subordinação objetiva.

A reclamação constitucional não pode ser utilizada como instrumento processual para revolvimento de fatos e provas. Também não pode ser utilizada como sucedâneo recursal. Nessa hipótese, é inadmissível a reclamação constitucional, na medida em que o seu cabimento  exige o preenchimento dos requisitos formais sem invasão da esfera material da decisão pelas instâncias trabalhistas.

De acordo cos os incisos XXXVIII e LIII, ambos do art. 5°), não haverá juízo ou tribunal de exceção, bem como ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente. Nesse contexto, o juiz natural constitui garantia principiológica processual de natureza constitucional. Com efeito, entre nós, constitui juízo assertivo constitucional a proposição segundo a qual
todos os brasileiros são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo- se-lhes, e aos estrangeiros residentes no Brasil, a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade; de maneira que não haverá juízo ou tribunal de exceção, bem como a certitude de que ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente.Dinamarco verbera que o princípio constitucional do juiz natural compreende o trinômio: (a) julgamentos por juiz e não por outras pessoas ou funcionários: A Constituição dá corpo à garantia de ser julgado exclusivamente por juiz,  ao elencar taxativamente os organismos judiciais do país, aptos portanto a serem juiz natural das causas que vierem a julgamento. Trata-se do Supremo Tribunal Federal, Superior Tribunal de Justiça, Tribunal Superior do Trabalho, Superior Tribunal Militar] e tribunais e juízes inferiores de todas as justiças (eleitoral, trabalhista, militar, federal, estaduais comuns e estaduais militares onde houver) […]; (b) preexistência do órgão judiciário, sendo vedados, também para o processo civil, eventuais tribunais de exceção instituídos depois de configurado o delito: O órgão judiciário competente deve preexistir aos fatos com base nos quais a causa será proposta – e essa é a segunda garantia relacionada com o juiz natural.
Ao vedar a instituição de tribunais de exceção (Art. 5°, inc. XXXVII), quer a Constituição Federal impedir que, já delineada uma situação, venha o Estado a criar órgãos ou organismos  ndere çados a julgamentos segundo influências espúrias […]; (c) juiz competente segundo a Constituição e a lei. Nesta última propriedade (necessitação de juiz naturalmente competente), o legislador adjetivo, em linha com o constitucional, não hesitou em prescrever que a determinação da competência se dá no exato momento do registro ou da distribuição da petição inicial, sendo irrelevantes as modificações do estado de fato ou de direito ocorridas posteriormente, salvo quando suprimirem órgão judiciário ou alterarem a competência absoluta. Ora bem: Considera-se competente o juiz como tal definido pela Constituição ou pela lei mediante a indicação taxativa das causas que ele tem a atribuição de processar e julgar. É indispensável, em outras palavras, que, entre o juiz
e a causa, exista uma relação de adequação legítima (Celso Neves), que só a Constituição e a lei definem e só elas podem alterar. Não é lícito impor a alguém um juiz cuja competência não resulte da Constituição ou da lei em vigor no momento da propositura da demanda […] – não sendo permitido sequer aos mais elevados órgãos do Poder Judiciário alterar as regras de competência estabelecidas no direito positivo. Tal é o significado do disposto no inc. LIII, do art.5°, da Constituição, ao proclamar o direito a julgamento por juiz competente.

A competência material é uma das garantias individuais fundamentais da Constituição, que não pode ser objeto de revisão e/ou revogação arbitrária; hipótese somente possível de cogitação mediante vontade e volição soberanas da vontade geral que a germinou. Pelo fato de possuir status de envergadura constitucional, o legislador constituinte, ao tratar da possibilidade de Emenda à Constituição, não vacilou em dizer: não será objeto de deliberação proposta de emenda tendente a abolir “os direitos e garantias individuais”. A esse imperativo constitucional se juntam outros categóricos arrolados no Título II, dos Direitos e Garantias fundamentais, do Capítulo I, dos Direitos e Deveres Individuais e coletivos – mais precisamente no art. 5º, a saber : Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo- se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes […] XXXV – a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito; XXXVII – não haverá juízo ou tribunal de exceção […] LIII – ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente […].

Ora bem: os direitos e garantias individuais fundamentais acerca da competência material da Justiça do Trabalho ganharam o status de cláusula pétrea na Constituição Federal de 1988, que os disciplinou no inc. IV, do § 4º do art. 60 da CF/88, visando proteger o Texto Constitucional de leis ordinárias e/ou emendas que tentem atingir o núcleo essencial desses direitos, ou tendam a aboli-los, como o que diz que (i) não haverá juízo ou tribunal de exceção e que (ii) ninguém será processado nem sentenciado senão por autoridade competente. Realmente, nenhum cidadão brasileiro poderá ser processado ou sentenciado senão por autoridade competente. Inobservar tal cânone constitucional é ir de encontro ao Pacto de São José da Costa Rica (Convenção Americana sobre Direitos Humanos), assinado pela República Federativa do Brasil, cujo art. 8º é peremptório ao prescrever que: Toda pessoa tem direito a ser ouvida, com as devidas garantias e dentro de um prazo razoável, por um juiz ou tri bunal competente, independente e imparcial, estabelecido anteriormente por lei […] para que se determinem seus direitos ou obrigações de natureza civil, trabalhista, fiscal ou de qualquer outra natureza. Com efeito, o art. 5°, §2°, da Carta Magna, expressamente estabeleceu que os direitos e garantias expressos no caput do mesmo dispositivo não excluem outros decorrentes do regime dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte.

A competencia material constitucional, amalgamada pelo principio do juiz natural, clausula petrea e direito fundamental social, constitui garantia imutavel pelo influxo determinante da rigidez constitucional, enquanto limite absoluto ao poder funcional de revisao. A competencia material nao esta sujeita a rigidez relativa, seja via revisao legislativa ou interpretacao judicial, malgrado a norma juridica constitucional garanta ao STJ e STF o direito/dever de decidir sobre competencias materiais (inciso III, do art. 927, do CPC; alinea l, do inciso I, do art. 102, da CF/88; e alinea f, do inciso I, do art. 105, da CF/88). Revela-se ilicita toda interpretacao constitucional que transmuta a competencia material (absoluta) de uma Justica em favor de outra, como se o interprete detivesse poder constituinte originario – ou, pior, derivado; ou ainda poder jurisdicional legislativo. Por forca do carater principiologico que encerra a competencia material, o juiz natural, a clausula petrea, a triparticao de poderes e a rigidez absoluta constitucional, revela-se exorbitante que um orgao do Poder Judiciario pretenda dizer mais – sobremodo, em sede competencional –,quando leis (infra e constitucional) estabelecem limites claros.

A cobrança de honorários advocatícios de sucumbência objeto de sentença proferida por juiz (a) do trabalho, bem como solução de eventual controvérsia acerca de sua titularidade, podem ser efetuados no juízo que decidiu a causa principal, a critério do titular do direito à percepção dos honorários. Segundo o artigo 516, inciso II, do Código de Processo Civil (CPC), a regra de competência para o cumprimento de sentença se efetua perante o juízo que decidiu a causa no primeiro grau de jurisdição. O fato de o título executivo ter-se originado de vara especializada não tem o condão de alterar a competência absoluta do respectivo juízo para o cumprimento de sentença de seus julgados.

Contudo, muito embora os honorários sucumbenciais devam ser executados perante o mesmo juízo competente para o cumprimento de sentença da tutela principal, o exequente pode fazer opção diversa, de acordo com o disposto no parágrafo único do artigo 516 do CPC. Nesse sentido, o Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), em seu artigo 24, parágrafo 1º, "atribui ao advogado exequente a faculdade de escolher o juízo para dar início ao cumprimento de sentença da verba honorária que lhe é devida, admitindo a sua realização no mesmo feito da ação da qual se originaram os honorários".

Esclareça-se, por fim, que solução de ventual controvérsia acerca da titularidade dos honorários de sucumbência insere-se na competência para instituição e cobrança do crédito.

A fixacão da competência material está diretamente vinculada à causa de pedir representada na ação e/ou reclamatoria; de modo que, havendo alegação de existência de vínculo empregaticio, e requerimento de pagamento de verbas decorrentes de contrato de trabalho, competente para conhecer da demanda e dela decidir será a Justica do Trabalho, pois que a matéria em lide é eminentemente trabalhista. Inteligência do art. 282, do CPC/2015 c/c o art. 8º, da CLT, sublimados pelos incisos I e IX, do art. 114, da CF/88.

A Justiça do Trabalho é competente para processar e julgar as causa decorrentes da relação de trabalho, nos termos do art. 114, I, da CRFB/88. As pessoas que prestam serviços por intermédio de empresas-plataformas são trabalhadoras e, por isso, independente da relação jurídica afirmada em juízo, devem ter seus litígios solucionados pela Justiça do Trabalho. Ainda que pretendam, por exemplo, a nulidade do cancelamento do cadastro realizada pela empresa-plataforma, mesmo que não afirmem a existência de relação de emprego, mas fundada no contrato mantido com a empresa-plataforma, não há justificativa para afastar a competência da Justiça do Trabalho. A indicação da natureza do contrato (civil ou trabalhista) e as regras de direito material inerentes não é suficiente para retirar a competência da Justiça do Trabalho, a exemplo do famoso CJ 6959, da lavra do Ministro Sepúlveda Pertence. A presente tese é mais ampla em comparação com aquela aprovada na 20a Edição do Conamat, pela Comissão 3, sob número 18. Ou deve funcionar com alteração de redação.

As decisões da Justiça do Trabalho, em qualquer grau de jurisdição, têm sido alvo de ações e procedimentos das diversas espécies, em especial e recentemente, pelo STF, em ADPF ou Reclamações, motivo pelo qual deve ser reforçado o fundamento jurídico de a competência para apreciar e reapreciar fatos e provas é das instâncias ordinárias da Justiça do Trabalho. Conflitos de Competência do STJ igualmente invadem, por vezes, o reexame de fatos e provas para retirar a competência de processos que deveriam tramitar perante a Justiça do Trabalhho. As Súmulas n. 126, do TST, n. 7, do STJ e 279, do STF, claramente atestam a competência funcional, retirando a possibilidade de a matéria ser desviada em sede de procedimentos alheios àqueles inerentes às instâncias ordinárias perante a própria Justiça do Trabalho, violando, também, o princípio ou requisito da aderência estrita, necessário nas Reclamações perante o STF.

O Governo Federal encaminhou recentemente ao Congresso Nacional um projeto de lei complementar que visa regular a relação de trabalho intermediada por empresas operadoras de aplicativos de transporte remunerado privado individual de passageiros em veículos automotores de quatro rodas.

A partir da leitura do Projeto acima, percebe-se que não houve a inserção de qualquer dispostivo tratando da competência para resolver os litígios entre os trabalhadores e as plataformas de tecnologia, vácuo normativo que deverá suscitar discussão sobre de quem seria a competência para processar e julgar esse tipo de demanda.

A ANAMATRA também deverá atuar nesta seara para defender a competência da Justiça do Trabalho, a fim de fazer para incluir dispositivo que preveja que os litígios serão resolvidos por esta Justiça Especializada.

A desconstrução do Direito do Trabalho por repetidas e sistemáticas decisões judiciais de Cortes Superiores constituem práticas de discriminação estrutural em face de trabalhadores pobres e de pouca instrução e caracterizam lawfare social ao reduzirem a proteção social, diminuírem o custeio previdenciário e aprofundarem a desigualdade social e de renda. Incumbe à Anamatra a defesa intransigente da normalidade jurídica e a da competência da Justiça do Trabalho para dirimir conflitos envolvendo relações de trabalho precarizados, inclusive para examinar e, se for o caso, reconhecer vínculo de emprego, inclusive de trabalhadores de plataformas digitais e em caso de pejotização ou fraude trabalhista.

A Constituição prevê a competência da Justiça do Trabalho para processar e julgar os dissídios que tenham origem na relação de trabalho (art. 114, I, da CRFB/88). Igualmente, a Constituição indica que compete à Justiça do Trabalho processar e julgar as ações de indenização por dano moral e "patrimonial" decorrentes da relação de trabalho. Também estabele a competência sobre as penalidades administrativas impostas pelos órgãos da fiscalização trabalhista aos empregadores. Na mesma linha, há comando constitucional apontando a Justiça do Trabalho para execução de contribuições sociais decorrentes das sentenças proferidas. Diante desse contexto normativo, os atos praticados pelo Judiciário Trabalhista que acarretem recebimento indevido por ente privado, pessoa física ou jurídica, ou pelo ente público, devem ser revistos no âmbito da própria Justiça do Trabalho, a exemplo de ações autônomas que discutem nulidade de arrematação, que chegam afetar terceiros (arrematantes), que seguem atividade cognitiva inclusive. Não há motivos para as demandas de repetição de indébito serem processadas, por exemplo, pela Justiça Federal, em casos de recolhimento superior de imposto de renda ou contribuições previdenciárias.

FUNDAMENTOS

1) Compromisso internacional do Estado brasileiro de assegurar a independência e a segurança dos juízes;

2) Dificuldades para implementação dos protocolos de segurança em razão das circunstâncias da localidade do dano;

3) Relevância dos bens jurídicos tutelados;

4) Notória celeridade da Justiça do Trabalho, em comparação com os demais ramos do Poder Judiciário;

5) Características intrínsecas à atividade dos garimpos ilegais, como: (i) se tratar de fenômeno com expansão relativamente recente; (ii) envolver alto investimento e alto retorno; e (iii) a possibilidade de ser financiado por organizações criminosas maiores;

6) Ausência de prejuízo à regular instrução do feito diante da possibilidade de participação em audiências por videoconferência ou de forma telepresencial, nos termos da Resolução CNJ nº 354, de 19 de novembro de 2020;

7) Adequação aos princípios do microssistema de tutela coletiva, à luz das ferramentas contemporâneas, em especial: a) princípio da competência adequada; b) princípio da máxima efetividade do processo coletivo; e c) princípio do ativismo ou protagonismo judicial.

(III) ESCLARECIMENTOS ACERCA DA EMENTA E FUNDAMENTOS:

a) Compromisso internacional do Estado brasileiro de assegurar a independência e a segurança dos juízes:

Considerando-se que os Princípios Básicos das Nações Unidas para a Independência do Judiciário são destinados primeiramente aos Estados e a que a independência e segurança dos juízes devem ser adequadamente asseguradas por lei;¹

Considerando-se que, nos termos do Código Ibero-Americano de Ética Judicial, juiz independente é “aquele que estabelece, a partir do Direito vigente, a decisão justa, sem se deixar influenciar, de forma real ou aparente, por fatores alheios ao próprio Direito” (art. 2º), devendo o Estado, como garantia da independência e imparcialidade, proporcionar os meios necessários à segurança pessoal e familiar dos juízes em função das circunstâncias de risco a que venham ser submetidos (art. 35);

Considerando-se os termos da Declaração de Yucatan, de 9 de abril de 2015, da Federação Latino-Americana de Magistrados (FLAM), em que se insiste na necessidade de que os governos da América Latina garantam o exercício da magistratura em condições que eliminem qualquer possibilidade de ataques à integridade física e psicológica dos juízes, além do protocolo aprovado em conjunto, com medidas de segurança e proteção aos magistrados da América Latina;

Considerando-se os arts. 1º e 5º do Código de Ética da Magistratura Nacional;²

Considerando-se os termos da Recomendação CNJ nº 114, de 20 outubro de 2021³ e da Resolução CSJT nº 315, de 26 de novembro de 2021⁴;

Há de se reconhecer o compromisso assumido pela República Federativa do Brasil de garantia da independência do Judiciário, direito humano consagrado no artigo 10 da Declaração Universal dos Direitos Humanos e no artigo 8, 1, da Convenção Americana de Direitos Humanos, entre outros documentos internacionais.

b) Medidas processuais voltadas à segurança física dos julgadores:

Associado ao aumento da forma de repressão ao crime organizado, operou-se a ampliação do regime de proteção dos agentes investigadores e do órgão julgador.

A depender do contexto, a exposição do agente estatal aos perigos decorrentes da insatisfação dos membros da organização criminosa e dos prejuízos ocasionados, pode colocar em risco a integridade física.

Nesse arcabouço de medidas voltadas à segurança dos magistrados e independência funcional, a Lei nº 12.694/2012 trouxe a possibilidade de, em âmbito federal, ser instaurado julgamento colegiado no 1º grau de jurisdição para os crimes envolvendo organizações criminosas.⁵

Quando da instauração do colegiado, que pode ser a nível de Justiça Estadual ou Federal, o juiz natural da causa deve fundamentar sua decisão indicando os motivos e as circunstâncias que acarretem risco à sua integridade física ou de seus familiares, em conformidade com o art. 93, IX da CF.

Posteriormente, com a promulgação da Lei nº 13.964/2019, conhecida como Pacote Anticrime, foi acrescentado o art. 1º-A à lei 12.694/2012, facultando aos Tribunais de Justiça e Tribunais Regionais Federais a criação de Varas Criminais Colegiadas destinadas ao julgamento de crimes de pertinência a organizações criminosas armadas ou que tenham armas à disposição.

A estrutura normativa procura preservar o julgador, ao mesmo tempo que convoca outros magistrados para o fim de diluir a responsabilidade em face da análise dos pleitos relacionados à organização criminosa

Nos termos do § 7º do art. 1º, os tribunais, no âmbito de suas competências, regulamentarão a composição do colegiado e os procedimentos a serem adotados para o seu funcionamento, previsão que garante o princípio do juiz natural.

Registre-se que o Julgamento por Colegiado não se confunde com a figura do Juiz sem Rosto, dado que há identificação física órgão julgador, com a possibilidade de a defesa apresentar exceções de impedimento e/ou de suspeição.

c) Dano local, regional e nacional (art. 93 do CDC):

Diante da interpretação conjunta do art. 2º da LACP (Lei n. 7.347/85) e do art. 93 do CDC, a competência funcional para julgamento das Ações Civis Públicas é do foro da Capital do Estado para os danos de âmbito regional, sendo do local em que ocorreu ou deva ocorrer o dano, quando de âmbito local.

d) Avanço do garimpo ilegal no Brasil⁶:

A área ocupada pelo garimpo ilegal no Brasil cresceu 35 mil hectares em 2022 na comparação com o ano anterior, segundo dados divulgados pelo MapBiomas, respondendo a Amazônia pela quase totalidade (92%) da área garimpada no Brasil.

Quase metade da área garimpada foi aberta nos últimos cinco anos, sendo ouro o principal interesse, respondendo por 85,4% dos 263 mil hectares garimpados.

Como aponta o coordenador técnico do mapeamento de mineração do MapBiomas, César Diniz, “O tamanho desses garimpos sobressai nos mapas, sendo facilmente identificável até por leigos. Surpreende que ano após ano ainda subsistam. Sua existência e seu crescimento são evidências de apoio econômico e político à atividade, sem os quais não sobreviveriam, uma vez que estão em áreas onde o garimpo é proibido”.

Nas Terras Indígenas, 15,7 mil hectares foram ocupados pelos garimpeiros em 2022, o que representa um aumento de 265% em cinco anos. Quase metade (43%) da área garimpada em UCs foi aberta nos últimos cinco anos.

e) Alto investimento e alto retorno:

Conforme estudo do Instituto Escolhas, a realidade do garimpo na Amazônia está muito distante de sua origem artesanal, demandando altos investimentos e com garantia de elevados retornos.

Intitulado “Abrindo o livro caixa do garimpo”⁷, o trabalho usou como exemplo as atividades garimpeiras realizadas na cidade de Itaituba/PA, onde o recurso que deve ser aplicado na criação de um garimpo de balsas (garimpo nas águas) é de R$ 3,3 milhões de reais, enquanto para o garimpo de baixões (garimpo terrestre) o valor do investimento gira em torno de R$ 1,37 milhão.

Em retorno, os garimpos de balsa na região faturam cerca de R$ 1,16 milhão por mês, totalizando mais de R$ 13 milhões anuais. Após dedução dos custos, os garimpeiros ficam com R$ 632 mil por mês, enquanto no garimpo de baixões fatura-se R$ 930 mil mensalmente, com rendimento líquido de R$ 343 mil por mês.

Referências

(1) Nações Unidas (ONU). Escritório Contra Drogas e Crime (Unodc). Comentários aos Princípios de Bangalore de Conduta Judicial / Escritório Contra Drogas e Crime ; tradução de Marlon da Silva Malha, Ariane Emílio Kloth. – Brasília : Conselho da Justiça Federal, 2008, p. 38-40. Disponível em: https://www.unodc.org/documents/lpo-brazil/Topics_corruption/Publicacoes/2008_Comentarios_aos_Principios_de_Bangalore.pdf. Acesso em: 28 fev. 2024

(2) Art. 1º O exercício da magistratura exige conduta compatível com os preceitos deste Código e do Estatuto da Magistratura, norteando-se pelos princípios da independência, da imparcialidade, do conhecimento e capacitação, da cortesia, da transparência, do segredo profissional, da prudência, da diligência, da integridade profissional e pessoal, da dignidade, da honra e do decoro.

Art. 5º Impõe-se ao magistrado pautar-se no desempenho de suas atividades sem receber indevidas influências externas e estranhas à justa convicção que deve formar para a solução dos casos que lhe sejam submetidos.

(3) Recomenda aos órgãos do Poder Judiciário a adoção de protocolos de segurança aos casos de magistrados em situações de risco.

(4) Entre outras medidas, regulamenta, no âmbito da Justiça do Trabalho de 1º e 2º graus, as Resoluções CNJ nos 291/2019, 344/2020, 379/2021, 380/2021, 383/2021;

(5) Art. 1º Em processos ou procedimentos que tenham por objeto crimes praticados por organizações criminosas, o juiz poderá decidir pela formação de colegiado para a prática de qualquer ato processual, especialmente:

I - decretação de prisão ou de medidas assecuratórias;

II - concessão de liberdade provisória ou revogação de prisão;

III - sentença;

IV - progressão ou regressão de regime de cumprimento de pena;

V - concessão de liberdade condicional;

VI - transferência de preso para estabelecimento prisional de segurança máxima; e

VII - inclusão do preso no regime disciplinar diferenciado.

§1º O juiz poderá instaurar o colegiado, indicando os motivos e as circunstâncias que acarretam risco à sua integridade física em decisão fundamentada, da qual será dado conhecimento ao órgão correicional.

§2º O colegiado será formado pelo juiz do processo e por 2 (dois) outros juízes escolhidos por sorteio eletrônico dentre aqueles de competência criminal em exercício no primeiro grau de jurisdição.

§3º A competência do colegiado limita-se ao ato para o qual foi convocado.

§4º As reuniões poderão ser sigilosas sempre que houver risco de que a publicidade resulte em prejuízo à eficácia da decisão judicial.

§5º A reunião do colegiado composto por juízes domiciliados em cidades diversas poderá ser feita pela via eletrônica.

§6º As decisões do colegiado, devidamente fundamentadas e firmadas, sem exceção, por todos os seus integrantes, serão publicadas sem qualquer referência a voto divergente de qualquer membro.

§7º Os tribunais, no âmbito de suas competências, expedirão normas regulamentando a composição do colegiado e os procedimentos a serem adotados para o seu funcionamento.

(6) MAPBIOMAS. Amazônia concentra mais de 90% do garimpo no Brasil. MapbioDisponível em: https://brasil.mapbiomas.org/2023/09/22/amazonia-concentra-mais-de-90-do-garimpo-no-brasil/Acesso em: 28 fev. 2024

(7) INSTITUTO ESCOLHAS. Abrindo o livro caixa do garimpo. Sumário executivo. São Paulo: Instituto Escolhas, 2023. Disponível em: https://escolhas.org/wp-content/uploads/2023/06/Sumario-Abrindo-o-livro-caixa-do-garimpo.pdf. Acesso em: 28 fev. 2024.

O Direito do Trabalho e a Justiça do Trabalho alcançaram seu ápice institucional com a Constituição da República/1988 e a Emenda 45/2004 que ampliou sua competência. Desde então, há 20 anos portanto, vêm resilientemente enfrentando desafios e transformações. Esta tese propõe, pela via de uma tríplice atuação, uma rede sinérgica de reforço de sua importância social e institucional com o deliberado propósito de redução da assimetria típica de relação capital-trabalho, fonte primária dos alegados altos índices da litigiosidade trabalhista e, por consequência, a criação das condições necessárias para observância dos princípio do não retrocesso social e da da não repetição ou reparação integral.

Tal atuação deve contemplar o aperfeiçoamento da:

a) jurisdição individual, de onde a Justiça do Trabalho historicamente extraiu sua legitimação desde os anos 30, pelo atendimento direto e imediato dos trabalhadores e trabalhadoras, significa dizer, uma justiça gratuita, sem intermediários, célere, oral, efetiva que se propõe à superação de óbices procedimentais e a garantia do acesso à justiça;

b) jurisdição coletiva, pelo aperfeiçoamento das potencialidades da destinação de suas indenizações aptas a (estimular) financiar a política pública de promoção do trabalho decente que, ao cabo, emancipa pessoas socio-economicamente pela criação de mais e melhores oportunidade de emprego;

c) a jurisdição interamericana, cuja observância dos compromissos internacionais assumidos pelo Brasil e das resoluções do SIDH exigem o compromisso do não retrocesso social e da não repetição de lesões.

A presente proposta, integrante desse trinômio de atuação, quer se deter sobre a jurisdição interamericana. O Brasil têm sido sucessivamente condenado por resoluções do SIDH com diversas incidências sobre o campo trabalhista. Na jurisdição regional do TRT8, por exemplo, são notórias as incidências do SIDH, citando-se os casos José Pereira, Fazenda Brasil Verde e mais recentemente o caso Gabriel Sales Pimenta.

No recente II Fórum sobre os Desafios Atuais para o Poder Judiciário e o Ministério Público”, promovido pela Organização dos Estados Americanos (OEA), entre os dias 29 de novembro e 1º de dezembro, em Belém (BA), a Carta de Belém, trouxe uma síntese das ideias, valores e princípios do evento, destacando-se: a) A importância do combate ao esvaziamento de competência de órgãos do Poder Judiciário e do Ministério Público, em matéria vinculada à promoção de direitos humanos, notadamente dos direitos humanos sociais;b) a consolidação dos direitos humanos sociais da Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica); c) a afirmação plena dos direitos humanos sociais, o que antagoniza com perspectivas e posturas reducionistas quanto ao campo de incidência das normas promotoras do trabalho decente.

A recente resolução Resolução Nº 364/ 2021 CNJ instituiu a Unidade de Monitoramento e Fiscalização das decisões do Sistema Interamericano de Direitos Humanos (UMF/CNJ) envolvendo o Estado brasileiro, vinculada ao Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e do Sistema de Execução de Medidas Socioeducativas (DMF).

Segundo o artigo 2º da resolução, a UMF/CNJ terá entre outras atribuições, criar e manter banco de dados com as decisões do Sistema Interamericano de Direitos Humanos, adotar as providências para monitorar e fiscalizar as medidas, sugerir providências, solicitar informações e monitorar processos judiciais, apoiar os órgãos do Poder Judiciário no cumprimento e implementação das decisões, divulgação e difusão dos tratados internacionais de direitos humanos, fomentar a cultura de direitos humanos e controle de convencionalidade.

O inciso XI, também lhe atribui apoio aos tribunais na criação de Unidades de Monitoramento e Fiscalização de decisões do Sistema Interamericano de Direitos Humanos locais (UMFs locais).

Portanto, propõe-se que a Anamatra promova junto ao TST e TRTs, em especial aqueles cujas regiões tenham incidências do SIDH, em atenção à Resolução Nº 364/ 2021, a instituição de Unidades de Monitoramento e Fiscalização Trabalhista e Regionais das decisões do Sistema Interamericano de Direitos Humanos envolvendo o Estado brasileiro em cada território respectivo.

A tese proposta tem como objetivo apontar os fundos estaduais voltados à promoção do trabalho decente como destinação mais adequada às condenações pecuniárias em ações civis públicas ou aos acordos homologados judicialmente no bojo dessas ações.

Sabe-se que no Judiciário Trabalhista existe a prática de destinar tais valores a instituições públicas ou privadas, diretamente, sob o argumento de maior eficácia da reparação, por considerar-se que a destinação ao Fundo de Direitos Difusos - FDD ou ao Fundo de Amparo ao Trabalhador – FAT não traz benefício direto aos sujeitos ou à comunidade violados.

Recentemente, o Plenário do Tribunal de Contas da União proferiu o acórdão 1955/2023¹, que em suas conclusões deixou expresso seu entendimento pela ilegalidade da prática:

9.2. determinar ao Ministério Público da União (MPU) que, no prazo de até 60 (sessenta) dias:

9.2.1. passe a recolher, ao Fundo de Direitos Difusos (FDD), os recursos provenientes das indenizações pecuniárias pactuadas nos acordos e ações com base no art. 5º, § 6º, da Lei 7.347/1985, bem como das multas aplicadas em razão de seus descumprimentos, ressalvadas as hipóteses em que legislação especial lhes prescreva destinação específica, nos termos dos arts. 13 da LACP e 1º, § 2º, da Lei 9.008/1995; (grifo nosso)

9.2.2. passe a recolher, ao Fundo de Direitos Difusos (FDD), os recursos oriundos de Termos de Ajustes de Conduta (TACs), firmados no âmbito do Ministério Público do Trabalho, exceto nos casos em que a destinação esteja amparada por decisões judiciais que determinem a utilização desses valores pelo Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) e ressalvadas as hipóteses em que legislação especial lhes prescreva destinação específica;

O TCU considerou que, ao destinar valores de condenação ou celebração de acordo diretamente a instituições públicas ou privadas, os montantes deixam de estar sujeitos às formas de controle a que estão submetidos todos os recursos públicos, deixando de ser contabilizados em sistemas próprios. Além disso, julgou que há prejuízo à transparência e à impessoalidade na escolha dos beneficiários, e também à fiscalização de sua aplicação, pois haveria identidade entre aquele que elege quem receberá o recurso e aquele que fiscaliza, concluindo que a gestão desses recursos deve seguir as regras próprias da administração pública. Em resumo, asseverou que a prática ofende os princípios e as regras pertinentes ao ciclo orçamentário e os critérios legais para a transferência de recursos da União.

De fato, a prática de destinação direta de valores objeto de condenação ou acordo em ACP ocorre mediante afastamento da incidência do artigo 13 da Lei 7.347/85 (LACP), que prescreve que os valores oriundos de condenação ou acordo em ação civil pública devem reverter para “um fundo” (sem especificação), apontando como requisitos desse fundo: 1) que ele seja gerido por um conselho federal ou estadual; 2) que nesse conselho gestor do fundo estejam presentes o Ministério Público e representantes da sociedade civil (comunidade)².

Como destacado, para o TCU a regra deve ser a destinação dos valores de condenações e acordos em ação civil pública ao Fundo de Defesa dos Direitos Difusos – FDD, fundo que é vinculado ao Ministério da Justiça e Segurança Pública, e de acordo com o site do Ministério “tem por finalidade a reparação dos danos causados ao meio ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico, paisagístico, por infração à ordem econômica e a outros interesses difusos e coletivos”.³

Observa-se que nas finalidades do fundo não há referência específica a violações a direitos trabalhistas, o que é revelador de sua vocação voltada a ações de competência da Justiça Comum, Federal ou Estadual. No mesmo sentido, em sua composição está prevista vaga para o Ministério Público Federal, mas não para o Ministério Público do Trabalho.

Defende-se, nesta tese, que a solução para compatibilizar o respeito ao artigo 13 da LACP e a necessidade de uma reparação local e voltada para o bem jurídico violado está nos fundos estaduais de promoção do trabalho digno/decente, e já existem experiências bem sucedidas.

O pioneiro foi o Fundo de Erradicação do Trabalho Escravo – FETE (Mato Grosso), instituído pela Lei Estadual 9.291, de 23 de dezembro de 2009 (https://www.jusbrasil.com.br/noticias/combate-ao-trabalho-escravo-mpt-em-mt-destina-recurso-ao-fete/2678582, acesso em 27/02/2024), seguido do Fundo de Promoção do Trabalho Decente – FUNTRAD (Bahia), instituído pela Lei Estadual nº 12.356, de 22 de setembro de 2011, alterada pela Lei Estadual nº 12.596, de 05 de novembro de 2012 (https://www.prt5.mpt.mp.br/informe-se/noticias-do-mpt-go/197-fundo-de-promocao-do-trabalho-decente-vai-financiar-projeto-para-erradicacao-do-trabalho-infantil, acesso em 27/02/2024). O mais recente é o FUNTRAD/PARÁ, criado pela Lei Estadual nº 9.952, de 26 de junho de 2023, ainda em fase de instalação do Conselho Gestor⁴.

Os três fundos são geridos por conselhos compostos pelo Executivo estadual, por órgãos do sistema de Justiça, incluindo o Ministério Público do Trabalho, e pela sociedade civil, atendendo portanto aos requisitos previstos no artigo 13 da Lei 7.347/85.

A destinação dos recursos para os fundos estaduais de promoção do trabalho decente proporcionam uma série de benefícios, destacando-se a a democratização do processo de escolha de objetivos e entidades contemplados com os respectivos recursos, e a maior instrumentalização dos repasses, por meio de convênios, termos de colaboração e termos de fomento, dentre outras espécies. Ademais, a responsabilidade pela fiscalização da aplicação dos recursos é do conselho gestor do fundo, formado por diversos órgãos e instituições, mediante análise da prestação de contas imposta àquele que os recebe, com publicidade e transparência.

Os FUNTRAD se destinam a financiar iniciativas voltadas a grupos de trabalhadores que tiveram seu direito ao trabalho digno violadas, o que abrange as garantias de igualdade, liberdade e dignidade no trabalho, em sentido amplo, apoiando a proteção, promoção, repressão ou capacitação sobre direitos humanos. Destaca-se que aqui reside a clara pertinência temática da tese com a Comissão 2 (Magistratura e Igualdade: gênero, raça, diversidade e suas transversalidades), pois os sujeitos das violações de direitos humanos tem prevalência de gênero, raça, classe social e escolaridade. São essas pessoas as vítimas do trabalho análogo à escravidão, do tráfico de pessoas, da discriminação no acesso e na permanência no mercado de trabalho.

Por fim, deve ser apontada a admissibilidade da ADPF 944 pelo plenário do STF, que levará ao Supremo Tribunal Federal a apreciação da legalidade da destinação direta de indenizações em dinheiro e multas fundadas na Lei 7.347/1985, oriundas de acordos (TAC) e ações civis públicas (ACP):

ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL 944 DISTRITO FEDERAL

RELATORA : MIN. ROSA WEBER

REDATOR DO ACÓRDÃO : MIN. ANDRÉ MENDONÇA

REQTE.(S) :CONFEDERACAO NACIONAL DA INDUSTRIA

INTDO.(A/S) :TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO

ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL. IMPUGNAÇÃO DE PADRÃO DECISÓRIO DA JUSTIÇA DO TRABALHO CONSISTENTE EM NÃO DESTINAR CONDENAÇÕES PECUNIÁRIAS EM AÇÕES CIVIS PÚBLICAS AO FUNDO DE DEFESA DE DIREITOS DIFUSOS – FDD OU AO FUNDO DE AMPARO AO TRABALHADOR – FAT. ART. 13 DA LEI Nº 7.347, DE 1985. ALEGADA VIOLAÇÃO DO PRECEITO FUNDAMENTAL DA SEPARAÇÃO DE PODERES NA DIMENSÃO ORÇAMENTÁRIA. PRELIMINAR DE LEGITIMIDADE ATIVA AD CAUSAM. PREENCHIDO O REQUISITO DA PERTINÊNCIA TEMÁTICA TRADUZIDO NO INTERESSE DIRETO DA CONFEDERAÇÃO EM PROMOVER O ESCRUTÍNIO DA CONSTITUCIONALIDADE DO CONJUNTO DE DECISÕES CONTESTADAS. VIOLAÇÃO DIRETA À CONSTITUIÇÃO

(…)

2. Não se está diante de situação de ofensa meramente reflexa à Constituição, a ensejar apenas controle de legalidade, porquanto se coloca em xeque a compatibilidade direta das decisões sob invectiva com os arts. 2º, 60, § 4º, inciso III, e 167, incisos I e XIV, todos da Constituição da República. Princípios da separação dos poderes e da legalidade orçamentária. Precedentes.

3. Dotados que são os valores decorrentes de condenações por dano moral coletivo de natureza predominantemente pública, sujeitam-se às etapas de realização do ciclo orçamentário imposto pela Lei Fundamental, do que exsurge a necessidade de serem direcionados tais valores a fundo específico, para ulterior destinação, seguido o rito adequado. Discussão que se confunde com o próprio exame do mérito da controvérsia.

4. Tampouco se trata de escrutinar situação individualizada na medida em que a prática de não se remeter os valores das condenações ao FDD ou ao FAT tem sido utilizada há anos pela justiça trabalhista. Nesse sentido, esclarece a ANPT que se “[t]rata-se de conduta adotada pela Justiça do Trabalho há mais de décadas” .

5. Arguição de descumprimento de preceito fundamental conhecida.

Por todo o exposto, defende-se que a magistratura trabalhista deve privilegiar os fundos estaduais de promoção do trabalho decente como destino de indenizações em dinheiro e multas fundadas na Lei 7.347/1985, oriundas de acordos (TAC) e ações civis públicas (ACP), respeitando a prescrição do artigo 13 da Lei 7.347/1985, e deve ainda estimular a criação de tais fundos, como exercício da participação da Justiça do Trabalho na formulação e execução de políticas públicas de promoção e defesa dos direitos humanos, especialmente no meio ambiente do trabalho.

Referências:

(1) Efeitos da decisão estão suspensos pela oposição de embargos de declaração pelo Ministério Público do Trabalho.

(2) Art. 13. Havendo condenação em dinheiro, a indenização pelo dano causado reverterá a um fundo gerido por um Conselho Federal ou por Conselhos Estaduais de que participarão necessariamente o Ministério Público e representantes da comunidade, sendo seus recursos destinados à reconstituição dos bens lesados.

(3) https://www.gov.br/mj/pt-br/acesso-a-informacao/perguntas-frequentes/consumidor/fundo-de-defesa-de-direitos-difusos. Acesso em 27/02/2024.

(4) https://www.agenciapara.com.br/noticia/51749/seirdh-lanca-editais-para-participacao-da-sociedade-civil-em-conselhos-e-programas-geridos-pela-pasta, acesso em 27/02/2024.

As gratificações genéricas, pagas a generalidade dos magistrados, independentemente da prestação efetiva de serviço, como sobre às férias, recesso judiciário, licenças e afastamentos autorizados do exercício da jurisdição, garante a incorporação desses benefícios aos vencimentos dos magistrados aposentados com direito à paridade, em analogia ao já decidido pelo STF e entendimento consolidado na Súmula Vinculante nº 20.

Conforme analisado por Júlia Mezzomo de Souza, no artigo publicado em 17/12/2015 por MIGALHAS DE PESO, sob o título “A incorporação de gratificações de desempenho aos proventos de aposentados de servidores públicos federais e o princípio da juricidade”, essa forma de pagamento de tais vantagens, em detrimento aos inativos que ingressaram no serviço público até a promulgação da EC 41, de 19/12/2003, “representa afronta à integralidade e à paridade, infringe o princípio da irredutibilidade de vencimentos, assegurado pelo art. 37, XV, da Constituição Federal e, ainda, viola o princípio constitucional de isonomia, consagrado no art. 5º, caput, da Carta Magna.”

- A Justiça do Trabalho exerce um importante papel da construção e na defesa dos Direitos Sociais, particularmente na sua seara própria trabalhista. Contudo, cada vez mais há uma desconstrução do sistema de proteção social, inclusive por meio de decisões judiciais com força vinculativa, que desconsideram a principiologia dos direitos fundamentais sociais. Urge criar no âmbito do Supremo Tribunal Federal uma Sala (ou Turma) de Direito Social, com juristas afetos a essa área, particularmente magistrados, procuradores, advogados, juristas e docentes trabalhistas. A Anamatra desempenhará esforços para propor alteração do desenho constitucional para a criação de Sala ou Turma de Direito Social no Supremo Tribunal Federal, a ser composta por especialistas da área.

Justificativa: A despeito de a citada Resolução n. 847, que dispõe sobre a acumulação de funções administrativas e processuais extraordinárias por magistrados federais de primeiro e segundo graus não diferenciar o exercício de funções de gestão entre titulares e substitutos no exercício da titularidade, há Regionais que desrespeitam o comando administrativo ao não reconhecerem ao substituto o seu papel de gestora, quando do exercício da titularidade. Impõe-se questionar a Administração acerca desta postura discriminatória.

Art. 13 da Lei 5.010/1966 c/c art. 3o da Res CJF 001/2008 e Art. 13 da Lei 5.010/1966 c/c art. 3o da Res CJF 001/2008 e art 2º, II c/c art. 5º, caput c/c Resolução 847 Conselho da Justiça Federal, assim como, por exemplo, a Planilha de 18/11/2023 do TRF da 1ª Região do Processo SEI 0040989-36.2023.4.01.8000. Resolução 372/CSJT.

Juiz na Titularidade de Vara exerce funções proprias de Gestor, tal como se ve nos Fóruns de Gestão Judiciária direcionados a toda a magistratura: Gerenciamento de METAS, Gestão de pessoas da unidade, Gestao de processos, Gestão de prazos, entre outras atribuições além das jurisdicionais. Também se ressalta que o juiz titular/na titularidade e o Juiz-Corregedor natural da Vara do Trabalho.

Ainda assim, a despeito de a citada Resolução n. 847/CJF e a Resolução 372/CSJT, que dispõe sobre a acumulação de funções administrativas e processuais extraordinárias por magistrados federais de primeiro e segundo graus não diferenciar o exercício de funções de gestão entre os magistrados, há Tribunais Regionais do Trabalho que desrespeitam o comando administrativo ao não reconhecerem ao Titular e nem ao Substituto o seu papel de gestor quando do exercício da titularidade. Impõe se questionar a Administração acerca desta postura discriminatória para toda a magistratura, colocando o Juiz do Trabalho Titular ou na Titularidade amplamente distante do Juiz Federal Titular ou na Titularidade, como já reconhecido expressamente, pelo TRF1 (Planilha Funções administrativas do primeiro grau (19641660) SEI 0040989-36.2023.4.01.8000. A autenticidade do documento pode ser conferida no site https://sei.trf1.jus.br/autenticidade informando o código verificador 19641660 e o código CRC 2E3FB0E6. Documento assinado eletronicamente por Rodrigo de Godoy Mendes, Secretário(a)-Geral da Presidência, em 18/12/2023, às 17:26 (horário de Brasília), conforme art. 1º, § 2º, III, "b", da Lei 11.419/2006).

JUSTIFICATIVA: O Conselho Nacional de Justiça, na Resolução nº 133 de 21/06/2011, pontuou a “simetria constitucional existente entre a Magistratura e o Ministério Público, nos termos do art. 129, § 4º, da Constituição da República, e a autoaplicabilidade do preceito”. Por sua vez, em sua 16ª Sessão Ordinária de 2023, o Plenário do Conselho Nacional do Ministério Público aprovou, por unanimidade, proposta de resolução que dispõe sobre a equiparação constitucional entre direitos e deveres do Ministério Público e da Magistratura. Na ocasião, foi salientado pela presidente do CNMP em exercício, Drª Elizeta Ramos, “a simetria constitucional entre as carreiras reflete a inegável existência de uma única magistratura, composta pelos membros do Ministério e do Poder Judiciário, ambos incumbidos da missão de promover a justiça e proteger o Estado Democrático de Direito”. Pelo Ato Normativo 0006697-61.2023.2.00.0000, de 17.10.2023, o Conselho Nacional de Justiça, também por unanimidade, reiterou a equiparação entre os direitos e deveres de juízes e de integrantes do Ministério Público, nos termos seguintes: “Os direitos e deveres validamente atribuídos aos membros da Magistratura ou do Ministério Público aplicam-se aos integrantes de ambas as carreiras, no que couber”. Todavia, tal equiparação nunca chega à Magistratura do Trabalho. Mais grave ainda, verifica-se total desigualdade entre as vantagens e prerrogativas conferidas à Magistratura Federal em confronto com a Trabalhista, embora ambas sejam custeadas pela União e devam observância às disposições da Lei Complementar 35/73. Em relação aos juízes do Tribunal de Justiça do Distrito Federal essa desigualdade é sobremaneira assente. À guisa de exemplo, o TJDFT aprovou a Resolução nº12, de 21.11.2023, cujo art.1º determina “por
força da simetria expressamente reconhecida pelo Conselho Nacional de Justiça (Resolução nº 528/2023) e do caráter uno da magistratura nacional (ADI 3854/DF), aplicar-se-á, no que couber, no âmbito do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios, aos magistrados de primeiro e segundo graus, o disposto no art. 222, inciso III, da Lei Complementar nº 75, de 20 de maio de 1993 e na Portaria nº 705, de 12 de novembro de 2012, da Procuradoria-Geral da República, e em seus atos regulamentares, que dispõem sobre a concessão de licença-prêmio por tempo de serviço aos membros do Ministério Público da União.” Enquanto isso, a Magistratura Trabalhista continua à margem das vantagens e prerrogativas reconhecidas a juízes federais e do Distrito Federal, no extenuante aguardo das deliberações de seu Conselho Superior, que somente servem a perpetuar a situação de desigualdade. A proposição visa, portanto, enfatizar o caráter uno da magistratura da União, e a necessária uniformidade de tratamento a seus membros, assim como o faz o inciso I do art.128 da Constituição Federal, ao elencar a a composição do Ministério Público da União ( Art. 128. I - o Ministério Público da União, que compreende: a) o Ministério Público Federal; b) o Ministério Público do Trabalho;c) o Ministério Público Militar; d) o Ministério Público do Distrito Federal e Territórios).

A Resolução CNJ n.º 528, de 23 de outubro de 2023, asseverou que os “direitos e deveres validamente atribuídos aos membros da Magistratura ou do Ministério Público aplicam-se aos integrantes de ambas as carreiras, no que couber”, reafirmando a amplitude da simetria entre as carreiras.  

Ao propor a Resolução acima referida, o presidente do Conselho, ministro Luís Roberto Barroso, afirmou que, além da Constituição assegurar a igualdade entre as duas carreiras, uma resolução de 2011 do CNJ já previa a equiparação e pontuou que:

"No arranjo institucional brasileiro, não se admite situação de inferioridade da Magistratura em relação ao Ministério Público. A questão se afigura simples, de mero cumprimento do texto constitucional e em linha com o que já decidiu este Conselho na resolução CNJ 133/11: a Constituição Federal determinou uma equiparação entre as carreiras do Ministério Público e da Magistratura. Parece claro, à luz do texto constitucional, que uma não pode ter, em relação à outra, situação de inferioridade ou superioridade".

Diante desse cenário, o movimento associativo deve buscar alternativas de atuação para concretizar a efetiva paridade entre as carreiras, pois na prática enfretamos os óbices dos temas 966 e 976 do STF.

Na Clínica Psicodinâmica do Trabalho enfatiza-se a fala do sujeito num coletivo de magistrados, com vistas à ressignificação do sofrimento e resgate do sentido de trabalhar no Judiciário. Destaca-se a importância da fala como ação e da interpretação como instrumento de análise, favorecendo a reflexão das vivências de prazer e de sofrimento por meio de uma análise crítica da realidade para construção de novos sentidos e oportunidade de transformações no Judiciário. Em cada encontro, há convite à identificação das vivências do trabalhar na Justiça e das relações de prazer e sofrimento no trabalho, com identificação das estratégias defensivas individuais e coletivas.

O projeto da Clínica do Trabalho foi delineado conforme o referencial teórico metodológico constante na abordagem da Psicodinâmica do Trabalho, desenvolvida na França, a partir da década de 1980, por Christophe Dejours, doutor em Medicina, especialista em medicina do trabalho, psiquiatria e psicanalista (obra: A Loucura do Trabalho: Estudo de Psicopatologia do Trabalho).

A clínica do trabalho tem como foco a promoção da higidez psíquica no trabalho, a análise da dinâmica de conversão do sofrimento psíquico em prazer através do reconhecimento e nas estratégias de enfrentamento utilizadas pelos trabalhadores para a superação e transformação do trabalho em fonte de prazer.

O foco é compreender o sofrimento e o modo como os trabalhadores lidavam com este no trabalho através do estudo das vivências de prazer e sofrimento no trabalho, nas diferenças entre o trabalho prescrito e o trabalho real, além de enfatizar o trabalho na construção da identidade social do trabalhador magistrado.

Estuda-se as novas configurações das organizações do trabalho, as estratégias defensivas, as patologias sociais e o sentido das vivências do trabalho. Propõe uma abordagem de ação e intervenção na própria organização do trabalho. Investiga-se a saúde e o adoecimento, bem como as estratégias de enfrentamento que os trabalhadores utilizam para ressignificar e superar o sofrimento, com vistas à transformação do contexto de trabalho em um lugar de prazer.

O trabalho, segundo a abordagem psicodinâmica de Dejours, constitui um campo de atuação que envolve o trabalhador magistrado em toda a sua subjetividade e complexidade. A prática da clínica psicodinâmica do trabalho favorece uma maior mobilização do coletivo, de modo que os profissionais possam ser capazes de resgatar o prazer, compartilhar a inteligência prática, por meio da cooperação, o reconhecimento e a própria identidade profissional, a partir da ressignificação das vivências de sofrimento no trabalho. Busca-se analisar a dinâmica da mobilização subjetiva e do reconhecimento no trabalho, além de identificar as principais patologias do trabalho com o propósito de sugerir intervenções que contribuam para a promoção de saúde.

No TRT10ª Região, a clínica do trabalho foi realizada em duas oportunidades, nos anos de 2018 e 2023, com 07 encontros por ano, com a oritentação da psicóloga Ana Cláudia Chehab.

A clínica do trabalho, preconizada por Dejours, constitui um método de análise crítica da realidade para a construção de novos significados em direção a uma mudança efetiva no ambiente organizacional e no próprio resgate do sentido do trabalho, mormente diante da gestão por números/metas, que renega para um segundo plano o trabalho bem-feito ao supervalorizar as entregas no menor tempo possível, imprimindo uma dinâmica de aceleração contínua do trabalho feito, com redução do tempo necessário de reflexão.

Nome: Francisca Brenna Vieira Nepomuceno – TRT10

A compreensão de um Judiciário trabalhista valorizado está em estreita conexão e interdependência com a ideia de juízas e juízes valorizados, como profissionais e como agentes de poder estatal.

No atual contexto de vertiginosa deterioração do prestígio da função, de contínuos massacres da imprensa, formadora da opinião pública, de progressivo achatamento do poder aquisitivo dos subsídios, a escolha dos juízes e juízas pela profissão da magistratura tem sido posta em xeque. Os mais antigos, ainda beneficiários das garantias constitucionais da integralidade e da paridade, afirmam que, se não estivessem apegados ao abono de permanência, já teriam se aposentado. Os nem tão antigos, porém migrados, propagam falas de desalento e arrependimento pela escolha da profissão; os mais novos, migrados, sem o sentimento de propósito e missão com a magistratura e impelidos pelos aspetos negativos acima enumerados migram para outras profissões.

Para resgate da valorização profissional, a luta da ANAMATRA pela pauta remuneratória, sempre essencial, precisa ser acompanhada de outras estratégias a partir das quais juízas e juízes restaurem, a partir da análise de suas realidades profissionais, o senso do que é bom, apreciável, positivo e que deve ser extremamente potencializado no exercício da magistratura.

Imperioso identificar as habilidades da magistratura trabalhista e de seus integrantes, prestigiar as suas competências e evidenciar a convergência destas em direção às metas desejadas de eficiência do sistema de justiça. Isso porque não se pode conceber a busca desenfreada do cumprimento de metas, às custas da dignidade e da saúde física e mental das juízas e dos juízes trabalhistas.

Essa recuperação de ideias deve derivar dos sucessos, das conquistas e dos valores das juízas e juízes que compõem o Judiciário trabalhista, numa perspectiva de passado, tomando-as como motivação e inspiração.

Posteriormente, esse grupo de pessoas visualizará o futuro ideal, melhor e sonhado, o futuro positivo e, por fim, planejará as mudanças para alcançá-lo, em nível organizacional, de processos, de equipes.

Nessa conjuntura, a partir do que lhe for pertinente, e em nível nacional, a Anamatra lutará para que seja concretizado.

Em suma, a partir da adoção de uma investigação apreciativa, é possível que os membros da magistratura trabalhista redescubram e/ou redefinam o que concretamente está no núcleo valorativo da profissão (pontos fortes, melhores práticas, inovações, competências, capital social, conhecimento agregado, valores, vantagens estratégicas) e, consequentemente, fortaleçam os laços de associativismo em torno do que vale verdadeiramente à pena a ANAMATRA lutar.

Há tempos que o tema saúde na magistratura é objeto de estudos e debates. Por meio de uma busca simples em sites de pesquisa da internet é possível encontrar inúmeros artigos, dissertações e teses sobre a saúde e adoecimento de juízes e juízas trabalhistas (SILVA, 2022). Além disso, muitos congressos e palestras são voltados ao tema. Grande parte desses estudos apontam o trabalho excessivo e estressante, como também a quantidade de cobranças e metas, aliado ao fato da própria função em si mesma, que demanda muita responsabilidade e cobrança pessoal do (a) próprio (a) magistrado (a), capaz de lhe gerar adoecimento. As doenças apresentadas são as mais diversas, como depressão e outras mais graves. Importante mencionar que as transformações tecnológicas e um mundo mais digital (PJE, audiências telepresenciais, análise de provas digitais, entre outras) embora em muito facilitam, também tem o papel de contribuir para o adoecimento do juiz ou juíza, caso não exista um cuidado com a saúde de forma preventiva. Muitos Tribunais instituíram programas de exames periódicos patrocinados exclusivamente pela Instituição. Contudo, não é, seguramente, a forma mais preventiva de evitar doenças, mas apenas descobrir com mais antecedência. Além disso, alguns Tribunais têm períodos de práticas integrativas voltadas para a saúde e bem-estar, mas não de forma constante e continuada, mas isoladas e que não se mostram suficientes. Pesquisa feta pelo CNJ demonstrou que a maioria do corpo da Justiça do trabalho é formada por magistrados (as) que têm, em média, 40 anos, o que demonstra não ser uma magistratura mais jovem em sua maioria (CNJ, 2024). A Instituição Justiça do Trabalho deve se atentar para isso e evitar o adoecimento dessa magistratura, diante de tantas cobranças e metas que somente aumentam. É mais que importante, é urgente um olhar atento da Administração para implementar programas práticos voltados para qualidade de vida e bem-estar. A título de exemplo, outras Instituições já vêm adotando essa postura, como é o caso do MPDFT (Ministério Público do Distrito Federal e Territórios), em que no seu orçamento já estão incluídas práticas voltadas para qualidade de vida e bem-estar de seus membros e servidores, desenvolvidas na própria sede e em salas específicas!. Ademais, programas dessa natureza vão ao encontro dos ODS (Objetivos de Desenvolvimento Sustentável) da ONU, da qual o Brasil é signatário - 3,8 e 16, contribuindo para a qualidade de vida dos juízes e juízas que também são trabalhadores, para o desenvolvimento de trabalhos decentes e uma Justiça mais eficiente.2 A baixa qualidade de vida prejudica a produtividade e contribui para o adoecimento. Institucionalizar atividades integrativas de qualidade de vida e bem-estar gratuito aos (as) magistrados (as) é ter um olhar atento às pesquisas e estudos sobre saúde já realizadas com a magistratura trabalhista brasileira, demonstrando 1 https://www.mpdft.mp.br/portal/ 2 https://brasil.un.org/pt-br/sdgs